Lolita, de Vladimir Nabokov

Lolita

Vladimir Nabokov é autor que me agita como poucos. Seu Lições de literatura russa gerou-me fortíssima e ambígua impressão. Depois, entrevistas, como a da Paris Review, consolidaram a imagem que dele tenho em mente: um gigante, mas de uma arrogância que me escapa à compreensão. E simplesmente não entendo algumas pedras atiradas por Nabokov como, principalmente, em Dostoiévski: permaneço em cima do muro a julgá-las invejosas ou expressão de honestidade intelectual. Tanto faz: minha mente padece dessa necessidade insuportável de julgamento; eu, não. Pois abro Lolita e, repetindo o que disse alguns dias atrás: basta uma página para perceber-me diante de um grande escritor, uma página para impressionar-me com uma escrita maravilhosa, elegante, brilhante no estilo e potente no conteúdo. A prosa de Nabokov, em Lolita, é dotada do corpo que a língua inglesa parece carecer. E não é somente por isso que a obra brilha: Nabokov ensina aos pares de seu século que escrever sobre corrupção moral não exige a corrupção da língua. Lolita cava fundo: são páginas assustadoras sobre a psicologia de um pedófilo, ambíguas desde o princípio, já pelo moralismo controverso, já pelo comportamento de Humbert Humbert, o protagonista, que oscila entre sarcasmo, amor, dissimulação e desejo, corrompendo terrivelmente uma jovem garota e instalando-nos na cabeça a dúvida infame: terá mesmo corrompido? O mero questionar é a confissão da imoralidade que nos habita a mente. E a obra-prima a prova cabal de que, no homem, o hediondo mescla-se ao sublime.

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