É conhecida a trajetória que levou o pensamento moderno a desconectar-se da realidade. Contudo, não deixa de espantar a força real e patente adquirida por alguns conceitos na mente moderna, muitos deles recém-fabricados, os quais se apresentam sem dizerem respeito a nenhuma realidade objetiva. Imaginar um filósofo a mergulhar-se e ocasionalmente perder-se em abstrações é algo natural; quando, porém, observa-se o grosso da sociedade a fazê-lo, isto é, o grosso da sociedade a raciocinar por conceitos autocontraditórios, por vezes escandalosamente vazios e impossíveis, é algo que se afasta da filosofia e escapa à normalidade. Aqui, só se pode compreender algo apoiando-se na psicopatologia e na engenharia social. Cria-se um conceito; este, fortemente estimulado, ganha vida própria, e então é disseminado como um vírus. Ninguém o compreende racionalmente; mas, ainda assim, consegue-se fazer com que as pessoas o sintam, com que desperte sentimentos e, portanto, com que seja efetivo. E brota, da histeria compartilhada, a validação impossível. O que mais escandaliza é ter-se tornado o processo comum e não escandalizar… Que transformação!
A experiência repetida do irreversível
A experiência repetida do irreversível ensina mais do que qualquer estudo. Só imbuído da noção da inescapável finitude pode o homem preencher sua vida de significado e compreender o valor do momento. Esta repetição persistente, magnificamente representada por Poe em The raven, ensina, de uma só vez, humildade, responsabilidade e urgência, algo que, com semelhante intensidade, livro nenhum é capaz de transmitir.
Talvez o maior problema educacional…
Talvez o maior problema educacional do mundo moderno, verificado especialmente nas metrópoles, é crescer o homem num ambiente quase isento de preocupações e necessidades imediatas, o que prejudica sobremaneira a sua percepção. O homem pré-histórico, por exemplo, via-se forçado a estar atento a ameaças constantes, a planejar o futuro para prevenir-se de intempéries, sabendo que o descaso poderia ser fatal. Se comia, sabia muito bem de onde veio sua comida, e também sabia o que era preciso fazer hoje para comer amanhã. Já o homem moderno, as imensas facilidades que o rodeiam não se acompanham da noção da dificuldade monstruosa para torná-las acessíveis. E assim ele cresce tomado por uma enganosa sensação de conforto, crendo a realidade garantida, sem a colaboração do ambiente lhe apontando como as coisas se dão.
A inconsequência é um excelente prenúncio
Algumas vezes, na juventude, a inconsequência é um excelente prenúncio, por demonstrar que o jovem trata de gastar logo o seu quinhão de estupidez. Se se poderia argumentar que para esta não há limites, também se há de reconhecer que há um dispêndio mínimo obrigatório, e até indispensável, o qual quanto antes despendido, melhor. Certas tolices, uma vez cometidas, ensinam muito; mas há fases que anulam o benefício de suas lições.