Há muitos trechos luminosos na argumentação de Hegel, mas suas conclusões parecem sempre incorrer no erro. Vai ele, com sua terminologia escusada, — e que soa terrível em português, — louvando a renúncia e o sacrifício, assentando-lhe o raciocínio num misto de lógica e moralidade, para então nos propor que ambos sejam feitos inútil e automaticamente, não por uma manifestação individual de abnegação, desprendimento, bondade, empatia ou o que for, mas pelo dever de cumprir uma ordem do Estado. Que conclusão! Seguindo o filósofo, o certo é que o discípulo, praticando-os dessa forma, jamais saberá o valor real da renúncia e do sacrifício. É tão óbvio quanto estúpido explicá-lo: aquele que sacrifica um bem ao próximo, quando é este necessitado, pratica uma ação de efeito imediato, e o sacrifício é portanto profícuo e virtuoso; aquele que, em contrapartida, sacrifica um bem ao Estado, isto é, a essa organização corrupta, autoritária, gananciosa e usurpadora, cujos recursos que espolia são empregados em grande parte na manutenção e ampliação do domínio que exerce sobre os indivíduos, o sacrifício não só é inútil, como toma contornos de insulto. Como é possível não percebê-lo? Isso para nem falar que tal sacrifício, no último caso, dá-se por imposição cujo não cumprimento implica castigo. Escuso-me, por mais uma vez benevolente, de esboçar uma conclusão.