Assim como em todo o resto, a abordagem junguiana para a interpretação de sonhos é muito mais interessante do que geralmente se faz em psicanálise. Partindo do mesmo e necessário princípio de que se há de encontrar um sentido para eles, mas não se restringindo a uma interpretação exclusivamente causal, Jung se abre a um horizonte infinito de possibilidades. Um analista atento rapidamente se impressiona com a disparidade entre os sonhos de um mesmo indivíduo, desde a lucidez de manifestação ao conteúdo quase sempre discrepante, ora calcado no presente, ora no passado, ora em fantasias e por aí vai. Há sonhos em que a linearidade facilita a compreensão, noutros há uma estranha sobreposição de cenas desconexas, senão imagens abstratas e ausência completa de nexo lógico. Não é raro haver a certeza sensitiva de que ocorreu tal ou tal evento num sonho, sem que dele se tenha retido elementos pictóricos; como ocorre também a memória de diálogos e discursos soltos, em manifestações que desafiam o raciocínio. Isso para não falar em sonhos que se ligam espantosamente a eventos concretizados no futuro. Jung, notando toda essa complexidade, acerta em abordar cada sonho individualmente e repugnar a tentativa de encaixotá-los todos num “manual de interpretações”. É verdade que o psicólogo, agindo desta forma, o mais das vezes encontra-se no escuro; mas tal humildade, para não dizer coragem, ocasionalmente pode recompensar.