Há, como diz Thoreau, um momento em que a honra reclama a desobediência civil intransigente, a despeito de a punição para tal comportamento ser a cadeia ou a forca. Esta coisa chamada democracia talvez resuma-lhe o valor em ter substituído tiranias declaradas ou, melhor dizendo, em ter o conhecimento destas últimas tornado “democratas” muitos homens de valor. Então vemos que, na prática, a tirania não fez senão mudar de nome. É impossível não pensar em Kafka quando confrontamos a tal democracia com o indivíduo solitário. Se pensamos, por exemplo, no imenso poder opressivo da máquina do Estado ou, mais especificamente, no dos iluminados de toga, que fazem cumprir quanto quiserem, vemos do outro lado um nada de joelhos, amarrado e sob ameaça dupla do chicote e da mordaça. Porém, agora, num misto de enredo kafkiano e nuances de Orwell e Huxley, a opressão é entregue em embalagens tão afáveis quanto falsas. Compreendê-lo e aceitá-lo de bom grado é atirar no lixo a honra e a faculdade de pensar.