Se há algo instrutivo em Dostoiévski, que deveria ser aprendido por todo artista, é o fato de que o cristão Dostoiévski, quando coloca palavras na boca de um niilista, deixa de existir. Isso é arte; é pré-requisito para uma obra que se tencione convincente. Se tomamos isoladamente Os demônios, por exemplo, essa obra magnífica em que o niilismo talvez nunca se tenha expressado de forma tão eloquente e multifacetada, o cristão Dostoiévski aparece tão acanhado, em meio a vozes múltiplas e fortíssimas, que aparenta quase inexistente. É por isso que muitos taxaram Dostoiévski, o cristão, de niilista. E é por isso que sua obra, suscetível de interpretações intermináveis, é um dos tesouros mais autênticos da literatura universal.