Parece-me a vaidade real — a profunda e inconfundível — conduzir à insinceridade e à hipocrisia, traços que se me afiguram como insuportáveis, quer na vida, quer na arte. Já notaram a face inocente de vários entre os maiores artistas de todos os tempos, como Tolstói, Dostoiévski e Shakespeare. E a inocência, caso dê as caras, não o faz senão pela sinceridade, que lhe é companheira obrigatória. É o que vemos, por exemplo, em Nietzsche, quando diz de Zaratustra a maior obra já concebida, ou quando se julga o maior entre todos os filósofos. Distorcido por línguas infames, passou por presunçoso, quando limitou-se a ser transparente como sempre foi. A vaidade manifesta-se na hipocrisia. Nietzsche viveu-lhe a obra, Dostoiévski creu com todo o espírito nas soluções que propôs. Ambos submeteram-se ao ridículo, expuseram-se. E não se humilharam, como fazem aqueles sedentos do reconhecimento, lançando mão da dissimulação.