Disse ontem algumas palavras sobre este livro; insuficientes, porém. Enfatizei meu respeito pelo autor, mas me esqueci do protagonista. Retrato-me nesta nota: Dom Pedro II é o maior exemplo de honra e prudência em toda a história do Brasil. Governou por mais de meio século, sendo sempre um ícone de tolerância e despego do poder; o Brasil pôde, graças ao seu temperamento, realizar uma troca de regime pacífica — quantos países podem gabar-se do mesmo? — e em troca, foi expulso do país como um ladrão, condenado ao exílio e à tristeza, passando seus últimos dias numa solidão desoladora. Quando morreu, solitário, dispondo de um saquinho com areia de Copacabana no bolso, os militares, liderados pelo abjeto Floriano Peixoto, negaram-lhe sequer uma representação diplomática no velório, que foi monumental, porém pago pela França, grata, entre outras coisas, por ter sido Dom Pedro II o primeiro estadista a visitá-la após arrasada pela Guerra Franco-Prussiana. O pungente de toda a história é que o “neto de Marco Aurélio”, como se lhe referiu Victor Hugo, resignou-se estoicamente em sendo alvo de cruel injustiça, crendo a história tratar de recompensá-lo. Hoje, bem sabemos, a memória de Dom Pedro II é inexistente; nossos estudantes não aprendem senão meia nota sobre sua vida e seu feitio. E está aí uma das belas ironias da história, muito bem representada pelo incêndio do Museu Nacional: sendo o museu, o caráter; e o fogo, a recompensa.
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