Algumas personagens literárias tiveram a felicidade de serem classificadas pela crítica como alter ego do autor. Outras já nasceram agraciadas com o selo proveniente do próprio mestre que lhes pariu. Alter ego… epíteto mágico capaz de dotar qualquer personagem de uma profundidade imediata, incutindo-lhe os passos com o peso da vida real. Engraçado! Não consigo pensar em literatura que não contenha, em grande medida, o peso da realidade do autor. A mim é simplesmente impossível imaginar um escritor a escrever abrindo mão das próprias impressões sobre a vida, das suas experiências, dos próprios julgamentos sobre si e sobre os outros, dos detalhes da existência que só ele nota, das observações que arquiteta sobre o meio em que vive. Se está a pintar um ambiente, pois tomará como base um ambiente que já presenciou ou imagina; se está a descrever um caráter, pois irá servir-se dos exemplos que a vida lhe concedeu. Sensações: o simples fato de imaginá-las em profundidade é, também, senti-las, e não é possível julgar que o autor esteja imune aos sentimentos que ele mesmo evoca. Como saberia descrevê-los, não fosse capaz de senti-los? Assim, o alter ego, termo de múltiplos sentidos, se pode, em psicologia, expor um interessante e complexo desvio de personalidade, em literatura normalmente expõe uma personalidade obcecada consigo mesmo: o autor.
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