O mérito de descolar-se do presente parece residir justamente na dificuldade de fazê-lo. Uma vida dedicada ao futuro ou, noutras palavras, uma vida centrada naquilo que permanece — eis o cenário ideal. Ocorre que, a contragosto, o presente está sempre interferindo, e poder-se-ia indagar se não depende a literatura deste choque, que acaba escancarando o problema da impermanência. Quer dizer: para além da necessidade expressiva, a literatura nasce de uma necessidade de preservação. Mais se afaste de ambas, mais o artista se deteriorará. E assim que, ainda que se possa idealizar um cenário onde os esforços convirjam inteiramente para o duradouro, parece de alguma maneira ser necessário que o presente lembre repetidas vezes sua razão.