Já notaram que o poeta converte-se com facilidade em bom prosador, enquanto o contrário dificilmente acontece. Comparada à prosa, a poesia apresenta um nível de dificuldade tão superior que ao poeta aquela parece-lhe quase brincadeira. Para compor versos é preciso, em primeiro lugar, estar num estado de espírito propício, isto é, num estado de espírito que permita concentrar-se inteiramente na composição. Dispersa, a mente não faz poesia. Em seguida, a lentidão no compor, as dificuldades técnicas, o grande número de elementos que se devem harmonizar na criação, tudo isso, com o tempo, acostuma o espírito a uma paciência e uma disciplina que, para fazer linhas em prosa, está muitíssimo além do necessário. Faz-se prosa à força; prosa fluida e natural. O simples movimentar dos dedos é suficiente para estimular a criação mental que, como por automatismo, registra-se ao mesmo tempo que vai sendo criada. Quão diferente é fazer poesia! O prosador acostumado com essa facilidade quase terapêutica, se arrisca-se a compor versos, encontrará algo muito, muito diferente…