O urubu-de-cabeça-preta

urubu-de-cabeça-preta

Vou eu, concentrado, batendo umas linhas inúteis, quando sou bruscamente interrompido por um urubu-de-cabeça-preta imenso, que quase me invade a cozinha e, em seguida, pousa em meu quintal. Fico a admirá-lo, imponente, pensando que jamais havia visto, de perto, um destes tão grande. Após alguns minutos, retorno à minha mesa e, antes que voltasse a escrever, pousa o urubu num poste, diante de minha janela. Penso sorrindo no verso de Augusto: “Ah! Um urubu pousou na minha sorte!”. Uma semana depois, pela manhã, vou eu compondo alguns versos amargos, quando novamente sou interrompido: um novo urubu, de mesma espécie, pousa-me no quintal reiterando o fato até então inédito. Vou observá-lo: noto que é um pouco menor que o primeiro, embora possa facilmente engolir um pombo numa bocada. Desta vez, detenho-me um pouco mais analisando-o. Parece ele não me notar enquanto reparo que, a despeito da crença popular, nada nele parece-me aventar mau agouro. Vou examinando, mais uma vez, o caráter majestoso desta ave, quando ela enfim alça voo. Num minuto, já está planando em altitude inalcançável para pássaros comuns, voando a seu modo todo particular, de asas abertas e estáticas o mais do tempo e subindo impulsionada por correntes, em técnica que outros pássaros nem sonham em dominar. Bonito! Perco-o de vista, e retorno inspirado à minha composição.