Um brasileiro só pode mirar com um sorriso toda essa exaltação de séculos feira às belezas, às flores e às cores desta tal primavera. A primavera representa, no Brasil, a chegada de um calor intolerável e uma infestação súbita de insetos. Representa, também, o adeus ao friozinho que só fazia reforçar a crença de que Deus é verdadeiramente e sempre bom. No Brasil, primavera é o nome que se dá para a união entre mosquitos, formigas, abelhas, grilos, vespas, baratas e todas as demais variações do mesmo estorvo que a imaginação divina foi capaz de conceber, que invadem simultaneamente os ambientes enquanto tentamos expulsá-las em transpiração intensa, respirando um ar abafado e com a sensação de que a substância da pele está a evaporar. A primavera, enfim, chega para lembrar-nos o quanto a detestamos.
É curioso observar que há faixas etárias…
É curioso observar que há faixas etárias que, devido à cumulação da experiência, propiciam, com enorme frequência, movimentos decisivos de teor semelhante. Precede a vida propriamente adulta uma decisão que corrobore ou rompa de vez com as aspirações da adolescência; a meia-idade reforça tal decisão ou, em casos nos quais foi esta postergada, oprime violentamente em razão da covardia do adiamento; já a velhice chega com a possibilidade única da síntese ou, no mínimo, com a última possibilidade de afirmação por caminhos não trilhados. E nota-se, repetidamente, que tais arcabouços, amparados em similares classes de vivência, produzem resultados também similares em teor, embora individualizados a depender das rotas palmilhadas. O fator idade, portanto, mostra-se fundamental e sobremaneira instrutivo na análise do homem.
Algo além da mera conveniência
Toda profissão exige, a partir de um certo momento, algo além da mera conveniência para que seja bem exercida. Tal ocorre de praxe quando a novidade desaparece da rotina, tornando-se esta a execução de tarefas já executadas na véspera. Então, caso não haja um motivador para além daquilo que se aufere por executá-las, caso não se extraia alguma satisfação no próprio exercício diário, o ofício torna-se insuportável, o exercê-lo torna-se enfadonho, angustioso, torturante. Assim que parece ao insatisfeito ter de escolher, de duas, uma: abandoná-lo ou sucumbir. Não se pode, pois, dar outro conselho senão o de que uma profissão deve ser escolhida tendo em vista sobretudo a satisfação que dela se pode extrair: no fim, tudo o mais que dela se poderá obter estará atrelado à existência dessa possibilidade, ou não.
O início
Parece o resultado de todo projeto artístico fundamentalmente dependente do entusiasmo e do vigor com que é iniciado. O espírito com que se lhe impregna esta arrancada é-lhe determinante. Para um mau começo, pois, ou um começo débil, não há muito o que se fazer, enquanto um começo vigoroso se pode estender pelo trabalho braçal e pela simples disciplina. Por isso é tão importante que se faça a ideação separadamente, num momento que preceda o executá-la. Assim, pode-se aproveitar do insuperável estímulo daqueles momentos em que a ideia se mostra pronta e parece a explodir.