Parece forçoso esboçar respostas

Imergindo-se em problemas, chega um momento em que parece forçoso esboçar respostas. Do contrário é desistir ou, ao menos, deixar de avançar. Muito se pode dizer das respostas em que, por exemplo, culminou a obra de Dostoiévski; o que não se pode dizer é que esta não tenha encarnado um ciclo completo. Nela estão representados problemas múltiplos em variadas manifestações, e para todos Dostoiévski aponta a solução —aceite-se ela ou não. Não há fugir: embora seja possível postergar o enfrentamento último, essa necessidade velada parece sempre à espreita a perguntar: “E então?” — e aparenta questão de honra apresentar-lhe uma conclusão.

Saber inglês é dever do intelectual moderno

Saber inglês é dever do intelectual moderno. Em primeiro lugar, por ser a literatura inglesa a maior do mundo — isto é, a que possui em maior número e há mais tempo produz consistentemente autores de primeira linha; — em segundo lugar, por ser o que mais se aproxima de uma língua universal — ou seja, a língua de mais comum intercâmbio e, também, a língua da literatura especializada em grande parte das áreas do conhecimento; — finalmente, pelo fato de os ingleses terem traduzido tudo: amiúde é mais fácil encontrar uma tradução inglesa que um original francês, italiano ou espanhol, para não dizer de línguas menos populares. Saber inglês, portanto, não é somente facilitar a vida de estudos, mas obrigação posto a falta do inglês priva o estudante de muito do que há de melhor disponível. De tudo isso, o problema. O escritor de língua portuguesa, quanto mais se empanturra do inglês, mais deve lutar para que, em hipótese nenhuma, permita-o penetrar sua escrita. Uma língua cuja força, a simplicidade, é também a maior fraqueza: sintaticamente o inglês é limitado; se vertido ao português tem-lhe a pobreza escancarada. Más traduções do inglês são intoleráveis, e mesmo originais devem ser lidos com muito cuidado, de preferência intercalados com obras vernáculas, e a precaução deve ser idêntica à do químico que coloca luvas antes de trabalhar.

O escritor profissional tem obrigação de ter sempre em mãos uma caneta

O escritor profissional tem obrigação de ter sempre em mãos uma caneta e um bloco de notas, — acordado ou dormindo, — sejam físicos ou virtuais. Do contrário, perderá grande parte de suas ideias, prejudicará seu trabalho e não será digno do epíteto profissional. Histórias tomam corpo, soluções são encontradas quando o raciocínio consciente descansa e o cérebro trabalha silencioso. Inopinada embora previsivelmente, ele se manifesta, então é dever do profissional registrar-lhe de imediato a manifestação, senão tende a perdê-la. Prezando pelo próprio trabalho, o escritor nunca se dará o luxo de desperdiçar seus momentos de inspiração.

Erigir uma obra fragmentária

Ganha muito o pensador ao optar, como fizeram Nietzsche e Cioran, por erigir uma obra fragmentária. Largando mão do delírio presunçoso e contraprodutivo da unidade alcançável, isto é, da perfeição supostamente alcançável, o pensador pode concentrar-se em conferir precisão e potência a pequenos fragmentos. Além disso, é indiscutível a superioridade de uma coletânea de aforismos a um ensaio qualquer: deste quase nunca justifica-se a releitura; daquela, a inata multiplicidade torna impossível a assimilação completa de uma única vez. Mais ainda: construir em fragmentos torna possível o assentamento preciso dos díspares e complicados movimentos mentais, quando desenvolver e aprofundar um raciocínio unitário impõe certamente um limite — ou seja, obriga a mente a dispensar grande parte de suas manifestações.