Regularidade e dinamismo

Saltamos da teoria poética inglesa para a portuguesa e observamos um contraste. Em inglês, valoriza-se a regularidade rítmica, quando parece teóricos portugueses concordarem que a variedade confere dinamismo aos poemas e, portanto, é preferível, para evitar a “monotonia”. O curioso é não suspeitarem estes últimos que não há ritmo sem regularidade e acabarem, fatalmente, elogiando o ritmo de poemas que não têm. Qualquer frase proferida em qualquer língua terá uma entonação, ou uma “cadência” própria quando analisada individualmente. A poesia, porém, dispõe frases de maneira que entre elas haja um elo harmônico, elo este determinado pelo ritmo. Se, de um verso para o outro, altera-se tudo, não pode haver ritmo na composição, a menos que se faça um uso criativo e não musical desta palavra.

Novamente Antero…

É impressionante como fui capaz de enxergar Antero através de seus versos. Leio-lhe uma biografia, e uma infinidade de fatos não descritos assomam-se a mim como óbvios — fatos que acabo confirmando na pena de outros biógrafos. Assim, compreendo-o inteira e perfeitamente, desde os tormentos íntimos à conduta; e se um Eça diz-lhe a convivência “fugidia”, embora “consoladora”, já sei os motivos, já deduzo o mistério que esconde essa postura aparentemente contraditória. Sei como Antero se sentia, e sei como lhe era pesado um fardo do qual não podia falar. É comovente vê-lo descrito por Eça, ver como impôs uma vitória esmagadora sobre seus conflitos interiores através de sua personalidade. E, finalmente…

O templo da glória literária

Segundo Schopenhauer, saiu da pena de d’Alembert esta virtuosíssima reflexão sobre o “templo da glória literária”:

L’intérieur du temple n’est habité que par des morts qui n’y étaient pas de leur vivant, et par quelques vivants que l’on met à la porte, pour la plupart, dès qu’ils sont morts.

Que coisa! E pior é notar raríssimas as exceções a essa regra. A conclusão mais evidente é aquela de Cioran, Valéry, Volaire, de ser o sucesso uma verdadeira desgraça ao artista. Porém, quando indagamos o porquê de tal dedução, somos levados a admitir que nada há de mais benéfico, senão essencial ao artista que uma mistura entre fracasso e solidão. Que lhe seja o isolamento produtivo é facilmente compreensível; mas o fracasso? o passar a vida preterido, senão repudiado? E notar que é o que se passou na esmagadora maioria das vezes com aqueles que se eternizaram no templo de d’Alembert.

São as pedras que definem o valor

Quando notamos exemplos tão comuns como o de Augusto dos Anjos, isto é, exemplos de uma mente que brota luminosa e independente, parecendo ignorar, senão preterir aquilo que é tido como fundamental, e notamos reações que costumam acompanhar este fenômeno, inclinamo-nos a concluir que são as pedras que definem o valor de um artista. É curioso como parece sempre, sempre a individualidade exigir um destacamento; individualidade esta que pode ser também chamada de essência ou identidade. E mesmo os artistas que cedem a estas idealizações conjuntas, a esta conformidade geradora de aplausos, têm de encarar um momento, talvez o momento, em que são como forçados a separar-se de todos e seguir adiante solitariamente, a despeito do que os outros possam pensar ou dizer. Tais reflexões só nos levam a questionar se servem estas associações literárias de algo que não evidenciar-nos quais são as ovelhas e quais são os artistas de valor.