Tomaria o budismo integralmente como modelo de conduta caso o fazê-lo não incorresse em assumir um estado de dependência que a mim é intolerável. Budismo, à risca, é largar tudo e viver de esmolas. Disto a conclusão: se o livramento final exigir como passo obrigatório a sujeição completa a este mundo, ainda que temporariamente, nunca o experimentarei. É como se, desejando liberdade, fosse necessário, primeiro, submeter-se a pior e mais plena das escravidões. Pensando melhor, faço a correção: não tomaria o budismo integralmente porque, integralmente, qualquer coisa torna-se intragável.
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As páginas de Jakob Boehme
É um verdadeiro choque entrar em contato com as páginas de Jakob Boehme. O primeiro impulso é perguntar: como é possível? O universo místico que lhe permeia as linhas parece impensável, inconcebível, imperceptível ao medíocre ser humano. De onde tão engenhosa imaginação? de onde essa concepção da vida que põe de joelhos a banalidade do concreto, tornando irrisório aquilo que os olhos podem ver? A noção do sentido último, a visão dos caminhos, a filosofia que implica uma conduta… todas essas manifestações de um espírito luminoso e respeitável, do qual escuso-me de fazer juízo de valor. Mas o que mais espanta, o que trava o raciocínio e atira o cérebro em perplexidade é estar ciente, a cada página, que o autor das linhas era sapateiro!
As visões do céu e do inferno de Swedenborg
Pode-se dizer várias coisas das visões do céu e do inferno de Swedenborg, exceto tratarem-se de obra de um espírito capcioso. Swedenborg possui a virtude suprema da sinceridade: não tenta iludir, esconder-se, abre-lhe a alma e busca expressar-se com a maior clareza possível — ou seja, trata-se de um espírito leal. É por isso, sobretudo, que não merece ser ironizado. Em casos como este, a ironia não passa de uma manifestação mesquinha…
Segundo Swedenborg, não serei aceito no céu
Se procederem as didáticas explicações deste curioso Emanuel Swedenborg, não serei aceito no céu. Não serei e adiciono: em hipótese nenhuma. Se não o céu, então… Mas reflito: necessariamente tenho de ser aceito nalgum lugar? Sou forçado a ansiar por aceitação? Estou, desde o princípio, condenado a suplicar que me aceitem? Se é assim, está excluída a possibilidade da rejeição plena: alguém terá de me aceitar — e eu, naturalmente, também terei de aceitar quem me aceite: todos privados da volição, condenados a juntarem-se à força num grupo. Desalentador…