Crime e castigo, de Fiódor Dostoiévski

Crime e castigo

Na primeira vez em que li Crime e castigo, levei dois dias para dar cabo às 590 páginas da minha edição. Foi inédito para mim ler um livro com tamanha voracidade. Lembro-me que, num sábado chuvoso, iniciei a leitura por volta das 16h; quando o sol raiou, às 6h do domingo, ainda estava eu com o livro nas mãos. Censurado pelo sol, optei por dormir algumas horas. Ao acordar, enveredei na sessão de leitura que daria remate ao livro. Mas por que meu encanto? Que é que tem esse livro de tão especial? Para começo de conversa, foi Crime e castigo meu primeiro contato com Dostoiévski: nunca havia lido nenhum autor que se aproximasse de sua acuidade psicológica. Lendo Crime e castigo senti-me, fisicamente, na Rússia; senti-me, aterrorizado, um assassino e senti-me, em maldição, assolado pela culpa. Pela primeira vez articulei e validei em mente pensamentos niilistas, que brilharam numa lógica incontestável e evidenciaram a mim a relatividade da moral. Páginas depois, tudo isso cai por terra, e Raskólnikov logra conduzir-me junto de si ao abismo. Febril, delirante, faz-me sentir na pele a tensão da culpa, o medo da perseguição. E, em meio a trevas, desesperado e arrependido, ensina-me o que é redenção; junto de Sônia, ensina-me o que é a carne e o que é a alma; e condenado, ensina-me o verdadeiro valor das coisas terrenas. Fechei o livro resoluto: aconteça o que acontecer, serei escritor.

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