A relação de alguns escritores com a doença…

A relação de alguns escritores com a doença é algo difícil de explicar. Uma pessoa normal, sem o menor desconforto, encontra as desculpas que precisa para não escrever. Se padece de alguma enfermidade, não há nem o que dizer. Então vemos não um, nem dois, mas muitos escritores que não apenas persistiram na doença por meses, anos, por uma vida inteira, mas fizeram da própria doença fonte de motivação. Não é pouca coisa, e não é algo fácil de imaginar. Há doenças com as quais nunca se acostuma; mas parece que, justamente estas, encurralam e não deixam outra opção.

É estranho desconhecer inteiramente…

É estranho desconhecer inteiramente, cem por cento da produção literária contemporânea e notar que escritor nenhum de país nenhum jamais se comportou assim. Escrever, fazer da escrita o centro da existência, e jamais ter aberto um romance de autor vivo! Desconhecer nomes, títulos, tudo! E prosseguir como se tudo estivesse dentro da normalidade… Se isso faz ou não faz falta, é questão ociosa; mas decerto é atitude que reforça a sensação de isolamento total.

Entre todas as línguas do mundo…

Entre todas as línguas do mundo, parece a inglesa a mais enganosa, posto que é aprendida com uma facilidade que falsifica totalmente a sua real dimensão. O turista que aprendeu a pedir um café no aeroporto crê dominá-la; mas se, por acaso, arrisca-se a ler um romance de Dickens, ou um poema de Milton, de Byron, de Chaucer, percebe em poucas linhas não saber nada da língua que aprendeu. E o curioso é que, sintaticamente, o inglês é sempre o mesmo: a estrutura dos períodos nunca complica demasiado a sua compreensão. Mas o inglês literário é um calabouço no qual o estrangeiro entra sempre sem lanterna. As palavras, as expressões infinitas, obscuras e intraduzíveis, são como assombrações. É preciso muita coragem para percebê-lo e encará-la enquanto escritor.

Algum escritor, certa vez, deu a sensata recomendação…

Algum escritor, certa vez, deu a sensata recomendação: uma obra de cada vez. E, sem dúvida, concentrar o espírito em uma única produção só pode acelerá-la, intensificá-la, sendo assaz benéfico para a criação. Mas é possível ser fiel a esta regra? Fazendo prosa, talvez. Já com a poesia, a situação muda, e quando os versos planejados ultrapassam algumas centenas, a mente parece rogar por uma válvula de escape na qual possa despejar linhas e linhas e experimentar o alívio da fluidez. Sem esta válvula, em pouco a improdutividade, somada às ideias que se acumulam num depósito fechado, começam a torturar. Ao poeta, praticar a prosa parece psicologicamente essencial.