De um autor tolera-se tudo…

De um autor tolera-se tudo, salvo a desonestidade. Falhar neste ponto é anular tudo quanto se produz. Como leitores, a mera sensação de que há numa obra intenções camufladas e que estamos a ser enganados é motivo suficiente para que a atiremos para longe; afinal, como fazer de bom grado papel de palhaço? Se não podemos, salvaguardados pela sinceridade do autor, dar-lhe o crédito necessário para uma leitura proveitosa, o melhor é abandoná-lo. Há, decerto, uma infinidade de outros autores que cumprem este requisito e têm muito a nos ensinar.

Cotejar o noticiário com os livros de história…

Cotejar o noticiário com os livros de história é algo extremamente educativo, por demonstrar absolutamente infundada essa sensação de premência, de que algo determinante está sempre a se passar. Quão pouco sobra destas ninharias! E nem é preciso valer-se da história: abrimos jornais de outros países, e verificamos a mesma inclinação, talvez demandada pelo marketing, de apresentar tudo como importante, enquanto nós, cá no fim do mundo, sequer conhecemos o grosso dos atores pintados como relevantíssimos. É, quase tudo, exagerado, quando o que realmente importa não se encontra em jornal nenhum.

Nelson Rodrigues gostava de repetir…

Nelson Rodrigues gostava de repetir que só um gênio seria capaz de tirar a inteligência brasileira do tédio. E enquanto viveu, percebe-se hoje, havia no Brasil uma inteligência passível de ser chacoalhada. Dir-se-ia, até, de que necessitava menos que um gênio para se movimentar. De lá para cá as obras perderam, se não força, efetividade. E para não repisar a ociosa crítica à inteligência inerte, o que salta aos olhos é a ausência de entusiasmo intelectual. Que há obras, que há autores, tem de os haver. Mas tornou-se dificílimo encontrá-los, quer pelo desinteresse generalizado, quer pelo falso interesse promovido sobre algumas obras. O resultado é haver barreiras e barreiras prejudicando o contato entre o autor e possíveis leitores. Estes, parece, ainda que tentassem encontrar o gênio, se renderiam aos obstáculos da procura.

Quase sempre, por piedade destas Notas…

Quase sempre, por piedade destas Notas, o comentário sai purificado do fato real contemporâneo que o motivou. Embora, sem dúvida, o efeito saneador seja palpável, talvez o comentarista pareça exagerar demasiado em seu radicalismo incontornável. Como, porém, é difícil comentar a atualidade! Daí que é preciso, às vezes, quebrar o protocolo. Arremataram num leilão em Nova Iorque, por mais de seis milhões de dólares, uma “obra” que consiste numa banana colada com fita adesiva numa parede. O comprador, dizem, adquiriu também o direito de replicar a “obra” quantas vezes quiser, e competirá a ele substituir a banana quando esta apodrecer. Que dizer? É, sem dúvida, uma manchete potentíssima; mas o que mais impressiona é ver nas milhares de matérias que não basta a obra, não basta o autor, não basta o preço, mas há plateia, há apreciadores, há divulgadores, há uma profusão vertiginosa de interessados! É demais! Cuidem-se bem estas Notas, pois o risco do contágio é real!