Por trás de todo estalo decisivo, há sempre a experiência sem a qual não se pode apreendê-lo, justificá-lo e aproveitá-lo. Disso se percebe que, quase sempre, o estalo não é senão a percepção súbita da finalidade da experiência precedente; quer dizer: o sentido daquilo que se experimentou como que se revela à consciência, e a partir deste momento o ato reveste-se de confiança e resolução.
Categoria: Notas
São muitos os exemplos de belas obras iniciadas…
São muitos os exemplos de belas obras iniciadas apenas tardiamente, mas é raro encontrar um grande escritor que não se tenha aventurado na escrita bem antes de ser capaz de produzir algo de valor. Em verdade, o capacitar-se a fazê-lo é justamente praticar até que adquira o domínio da prática, é experimentar, errar e aprender. O que por isso não se adquire é a bagagem do estudo e da experiência; mas por isso, e só por isso, adquire-se a capacidade de escrever bem.
A mente moderna, que erroneamente acredita…
A mente moderna, que erroneamente acredita, ou pelo menos se comporta como se a finalidade natural da vida humana fosse a busca pelo prazer, não pode entender como uma vida assim orientada conduz ao resultado oposto. Não pode entender como, invariavelmente, com tal prática experimenta-se pouco prazer e muito vazio; nem como, do vazio, surge uma desesperadora frustração. Tão desagradável como pode parecer a responsabilidade, parece a vida em torno dela orientada à mente moderna. Mas a responsabilidade, mais duradoura e produtiva, proporciona uma sensação de continuidade, satisfação e valor que prazer de nenhuma espécie jamais poderá oferecer.
De todas as características do intelectual moderno…
De todas as características do intelectual moderno, tal como concebido por Paul Johnson, talvez nenhuma cause mais estranhamento — ou seria vergonha? — do que essa desmedida vaidade, que não se limita a um alto conceito que o intelectual faz de si, mas pretende uma dívida inata dos outros para consigo mesmo. Que dizer? Faltam palavras para essa pretensão, bem ilustrada pelas divertidíssimas “begging letters”. Nada anormal na aflição proveniente da ausência de meios, acaso geradora de um sentimento de injustiça, tal como experimentado por Raskólnikov. Mas este, ao menos, age; ainda que imprudentemente, busca pelo ato próprio aquilo que julga merecer. Um delírio, é verdade, mas o emprego da força denota a consciência da ineficácia do argumento, do disparate que seria a tentativa de convencer alguém de uma dívida em razão de sua superioridade. É este um descolamento tão grande da realidade que só pode mesmo remontar às questões mais elementares da criação…