A história brasileira é um campo fertilíssimo para a sátira. Mas quiçá, entre o inesgotável festival de ironias, nenhuma seja mais divertida que o lema positivista enfiado na bandeira nacional, em ato que viria a fomentar a antítese do próprio lema, o qual nunca, nem por um mísero decênio, viria a manifestar-se na nação como modelo ao resto do mundo. Muito pelo contrário: após a proclamação republicana, o que decerto não houve foi ordem, e muito menos progresso, degradando-se ambos perante o ocidente, de maneira que hoje, pouco mais de um século após a importação do fictício e malfadado lema, o Brasil é certamente muito melhor e mais fielmente representado por “desordem e atraso”.
Categoria: Notas
Uma qualidade genuinamente brasileira
Uma qualidade genuinamente brasileira, certamente entre as mais positivas sob muitos aspectos, é esta predisposição ao bom humor. Talvez seja um traço africano, o mais importante traço africano na índole brasileira. O fato é que o brasileiro é refratário ao mau humor, e apresenta uma jovialidade diária, constante, quase inabalável, que torna a vida mais agradável e, sobretudo, evita os extremos a que pode conduzir uma má disposição. Tal leveza não se encontra na Europa, nem nas metrópoles americanas, e constitui um distintivo merecedor de maior apreciação. Contudo, se tal qualidade melhora a vida social e facilita imensamente o convívio, também é ela responsável pela aversão à reflexão profunda, algo muito bem atestado pela literatura nacional.
Sêneca disse que, se lhe oferecessem…
Sêneca disse que, se lhe oferecessem a sabedoria com a condição de guardá-la para si mesmo, sem poder comunicá-la a ninguém, não a desejaria. E é, mesmo, curioso que maior do que o encanto em compreender a realidade é o encanto em descrevê-la, verbalizá-la, que nos parece imprescindível para que nos provemos realmente a dominando, para que nosso pensamento realmente se consolide. Embora possuir a sabedoria e estar apto a comunicá-la sejam coisas distintas, o não saber comunicá-la parece-nos evidência de que a não possuímos plenamente, e há trabalho a ser feito para galgar este degrau.
Às vezes bate uma curiosidade de analisar…
Às vezes bate uma curiosidade de analisar a grade curricular de um curso de arquitetura, para tentar entender como foi possível essa regressão absoluta, indiscutível, escancarada nos resultados proporcionados pela evolução da técnica arquitetônica. A obsessão pelo baixo custo não parece suficiente para justificá-lo, posto não haver, mesmo nas cidades europeias, alguma em que a parte moderna seja visualmente superior à parte antiga. A arquitetura moderna é, resumidamente, mais feia e menos criativa. Que é isto, pois, que se ensina para que o profissional, com melhores recursos, produza algo expressamente pior?