O primeiro dever do escritor

Diz Lavelle:

Le premier devoir de l’écrivain doit être de s’élever assez au-dessus de toutes les circonstances de sa vie particulière pour fournir à tous les êtres un appui de tous les instants et les montrer à eux-mêmes tels qu’ils voudraient être toujours.

Tal dever talvez seja o mais difícil, porque o “elevar-se acima de todas as circunstâncias” envolve, primeiro, compreendê-las, e compreender como porventura elas se integram no painel maior da existência individual para, só então, tendo delas extraído um sentido cristalino, pensar em como este sentido pode ser transplantado à experiência humana geral. E comunicá-lo! De fato, não há experiência humana, por individual que seja, cujo sentido não se pode extrair em circunstâncias distintas; o difícil, contudo, é ver o grande no pequeno, algo que crescemos desacostumados a fazer.

Os melhores livros não nos revelam algo desconhecido

Como bem notado por Lavelle, os melhores livros não nos revelam algo desconhecido, mas algo que já sabemos intimamente e que, em razão de uma iluminação súbita, parecemos descobrir. Os melhores livros, pois, não fazem senão lançar luz em algo escondido em nosso interior. O curioso disso é ver que a sensação de descobrir algo que já sabemos grava em nossa mente uma impressão fortíssima, muito maior que a de aprender algo realmente novo e desconhecido. E, simultaneamente à identificação imediata com a ideia, estabelecemos, também de imediato, um ponto de contato com o autor.

Ideias não morrem com facilidade

Juan José López Ibor nota em 1951 que, pelo menos desde 1945, já havia quem considerasse a psicanálise algo “definitivamente muerto. Polvo y ceniza”, em seguida declarando: “el ciclo psicoanalítico está terminado”. E, no entanto, aí está… O que mais impressiona neste, e noutros casos, é notar que não faz a menor diferença que uma ideia, uma teoria, uma doutrina seja refutada e destruída intelectualmente: uma vez concebida, sua sobrevivência obedecerá a fatores outros que não a sua solidez no campo intelectual.

Mais injustificável que a obsessão…

Mais injustificável que a obsessão com a originalidade é esse constrangimento decorrente da constatação de que o dito agora já havia sido dito há muito tempo. Que dizer? O autor que, registrando as próprias impressões, nota algo já notado anteriormente, em vez de se constranger por não ter sido o primeiro, ou não ter tomado conhecimento da fonte primária, — muitas vezes irrastreável, — deveria satisfazer-se de ter chegado à mesma conclusão através da percepção direta, alegrando-se como se alegram aqueles que acham no outro algo em comum.