Às vezes me imagino diante de um leitor do futuro. Sou, para ele, um completo estranho; um bicho, diria… absolutamente incompreensível. Nossos hábitos não condizem, não temos afinidade de gostos, nossos gênios são, exatamente, opostos. Que pensaria ele de mim? Ora, tudo quanto se pensa de um animal pouco evoluído. E se meus costumes lhe causariam espanto, bem sei que jamais lhe obteria qualquer aprovação. Pela lente do leitor do futuro, observo, por exemplo, minha aguda misantropia: quanta repulsa! quanto estranhamento! Como é que pode um sujeito moderno se inclinar à solidão? E se não bastasse a expressão desdenhosa, vejo-a facilmente se transmutando em ódio, uma vez percebendo o desdém recíproco. Esse bicho, em verdade, merece umas boas pauladas! É um verdadeiro câncer social! E como câncer não pode, em nenhuma hipótese, proliferar! Risos, muitos risos… mal sabe o leitor do futuro que o bicho é psicologicamente castrado, que a ele repugna a multiplicação. Mas talvez o bicho delire, uma vez fantasiando esse leitor do “futuro”…
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