Mais curioso que exemplos como o de Baudelaire…

Mais curioso que exemplos como o de Baudelaire, que encontrou noutras bandas o seu ensaio de teoria estética já descrito e praticado, é depararmo-nos com autores, coevos ou não, que se assemelham em conteúdo e forma, embora se desconheçam. Os exemplos não são poucos, e atestam que a manifestação literária autêntica é um impulso antes instintivo, antes associado às particularidades da experiência que ao estudo propriamente literário.

A poesia não se basta a si mesma

A poesia, tal como sugere Guyau, não se basta a si mesma e, se grande, é a forma que positiva uma motivação ainda maior. É por isso que, em suma, o valor da arte atrela-se ao valor da motivação artística. A escolha pela forma poética é a vontade de gravar na superior e mais difícil entre as formas literárias aquilo que se manifesta sincera e violentamente no íntimo: é, enfim, o apreço por esta singular manifestação.

O clássico, o mais frequente e compartilhado drama…

O clássico, o mais frequente e compartilhado drama entre escritores é o anseio desesperado pela liberdade, que é atravancado pela impossibilidade de alcançá-la pela escrita. Quer dizer: a consciência do sentido de missão, a vontade ardente de realizá-la, mas o obstáculo natural e característico da profissão, a qual só com muita sorte ou após muito trabalho duro pode ser exercida com dedicação integral. Não há fugir desta sina; mas talvez, graças a ela, perdure a escrita, ainda hoje, como autêntica vocação.

Essa repulsa instintiva…

Essa repulsa instintiva, essa irracional contrariedade que se experimenta em relação a algo ou alguém frequentemente se prova mais razoável que o mais minucioso dos raciocínios. É muito curioso haver essa manifestação, talvez motivada pelo mais atávico instinto de sobrevivência, que gera um alerta a respeito daquilo que não se tem motivo para desconfiar. E então, repetidas vezes, segui-la para mais tarde aliviar-se do erro não cometido — e impressionar-se desta misteriosa capacidade…