A idolatria literária perdura e cessa tal como todas as outras: perdura pela ignorância, e cessa no momento em que o idólatra percebe que o idolatrado não se conforma totalmente às suas convicções individuais. Daí que facilmente converte-se em ódio nas cabeças mais fanáticas. A outra senda é a da maturidade, que prescreve entender que um grande autor jamais se adequará inteiramente ao nosso pensamento; do contrário, nada teria a nos ensinar. Mas é difícil, oh, como é difícil ao homem deixar de lado a vaidade e reconhecer no outro o diferente, como é difícil admitir e aceitar a grandeza que não se curva aos ditames de suas convicções! Enfim, é a lição de sempre: grandes autores são como são, e não como gostaríamos que fossem.
No fenômeno da psicografia…
No fenômeno da psicografia, nada impressiona tanto quanto a indiscutível qualidade literária de alguns textos, que justifica inteiramente o processo. A inteligência que se expressa com elegância e clareza prova-se, pela forma, merecedora de atenção. A expressão a sustenta e reclama o direito de apreciação zelosa, isenta de prejulgamentos, tal como se deve fazer com todo aquele cuja lucidez patenteia haver, no mínimo, ela mesma a se transmitir.
Somente dois momentos prazerosos
Na criação poética, talvez haja somente dois momentos prazerosos: o da ideação e, naturalmente, o da conclusão. O primeiro resume-se à ilusão, o segundo ao alívio. No restante do processo, não há senão luta e mais luta. Acerta-se um verso, mas a satisfação de um átimo desaparece perante a necessidade de acertar também o seguinte. Assenta-se a ideia, mas carece o verso de rima; coadunam-se ideia e rima, mas o ritmo desagrada. E assim sucessivamente, e isso somado à necessidade de encontrar palavras que, quando precisas, não se ajustam às necessidades do verso. O processo se assemelharia à montagem de um quebra-cabeça, não se tratasse este de matéria inócua a ser concatenada, não se tratasse este de um passatempo em cujo sucesso ou fracasso o praticante exime-se de consequências existenciais.
Há ideias que amadurecem e ideias que o tempo faz apodrecer
Há ideias que amadurecem e ideias que o tempo faz apodrecer. A todas, contudo, parece o tempo benéfico, ficando a exceção apenas para aquelas que irrompem exigindo a imediata transposição ao papel. Mas estas, se bem analisadas, talvez não sejam exatamente ideias, ou somente ideias, mas estados de espírito passageiros que, desperdiçados, podem jamais retornar.