Chineses e a vaidade

Sou, há quase uma década, vizinho de porta de uma família chinesa. Acabei, por esse motivo, tendo a oportunidade de conhecer e conversar com mais de uma dezena de chineses. E de um tempo para cá, sem nenhuma razão aparente, passei a articular: parece-me — posso muito bem estar enganado… — que o chinês, via de regra, é menos vaidoso que o ocidental. Aprofundando-me a investigação, descobri que na China não há, por exemplo, debate político. Vejam só! Sempre pensei que um mundo sem debates políticos seria menos arisco e que, sumariamente, todo debate de ideias é, antes, uma guerra de vaidades. Pois que o chinês comum não sente a menor necessidade de ver debatedores disputando inteligência, provando ao público a sensatez das próprias ideias! E o chinês comum não liga o rádio para ouvir o comentarista político a dizer: “Tenho a melhor análise!”, ou para ouvir o comentarista econômico a prever: “Tal medida falhará!”. O chinês comum, parece-me, faz cuidar da própria vida; e a China, parece-me, não caminha quase a estourar em debates, polêmicas, vendo verter o ódio a qualquer lugar que se olhe, com seus cidadãos em rixa, agressivos uns com os outros, quase a se matar por opiniões pessoais estúpidas a respeito de assuntos que, não bastasse o desconhecimento, não lhes guardam a menor possibilidade de ação efetiva. Por um momento, julgo o chinês comum superior ao maior de nossos eruditos.

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Ideias venenosas

Tenho algumas ideias bastante venenosas, por exemplo, esta: só atingirei a plenitude no dia em que não souber dizer o nome do presidente do meu país. Confesso, tenho-me esforçado: já não leio notícias quaisquer, não ligo uma televisão há anos, não sei dizer quem é o atual vice-campeão brasileiro e outras façanhas. Mas sei que a plenitude, a paz de espírito e a sabedoria só virão no dia em que me perguntarem: Em quem votaste para senador? Que pensas do novo projeto de lei? Que achaste da nova composição ministerial? E para todas estas eu não responder senão com um sorriso sarcástico na face.

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Diplomas e conhecimento

Acho graça do culto ao diploma. Minha mente voa… Fico imaginando daqui a quanto tempo exigirão diploma para atletas: “Rapaz, antes de bater o recorde mundial dos 100 metros rasos, vá atrás do teu diploma de velocista!”, ou para padeiros: “Não, não… isso que fizeste não é um pão. Para fazer um pão precisas, primeiro, de um diploma de padeiro”. Acho graça porque claramente o sistema de ensino brasileiro colapsou, enquanto há gente a que agrada humilhar os outros calcando-se em diplomas. Hoje, um diploma não vale muita coisa… Qualquer um forma-se, qualquer um compra um diploma. Sumariamente, a diferença de um engenheiro para um cobrador de ônibus, hoje, é o bigode. E tenho um diploma de engenharia escondido em algum lugar de minha casa; falo, pois, com a autoridade de um diplomado que um diploma não tem relação necessária com conhecimento, somente diz que o diplomado obteve média na somatória de provas e trabalhos e compareceu na frequência mínima exigida pela instituição. Conhecimento é outra coisa.

Natureza…

Não sou um entusiasta da natureza. (Pedras!) Sei que, para muitos — todos? — a palavra natureza inspira uma paisagem silenciosa, pura como uma fresca nascente a deitar no tranquilo ramalhar das árvores sob o brando movimento das águas. A mim, não. Quando penso em natureza, minha mente associa — e me não pede permissão! — primeiramente, à imagem de uma mata fechada; em seguida, à sensação de meus pulmões sendo insuflados de ar puro e, bruscamente, ouço um zunido insuportável de mosquitos, que se transforma no silvar agressivo de uma cascavel. Assustado, sinto um arrepio. Sim, sim: minha casa é a poluição e o cinza.

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