A contingência em Nassim Nicholas Taleb

Nassim Nicholas Taleb, matemático hoje bastante conhecido no Brasil, agora que marqueteiros aprenderam a usar seu nome para vender consultorias, é certamente muito mais do que um trader. Se grande parte dos idiotas que vendem recomendações de compra no mercado acionário tivessem realmente lido Taleb, aprenderiam o seguinte: o homem não pode prever o futuro. Taleb, cuja obra evidencia a invalidade de quase tudo o que se produziu em finanças modernas, ensina que o cálculo de risco é problemático por procurar estabelecer um comportamento futuro baseado em comportamentos passados. E que, de praxe, sempre que tentarmos prever o futuro, estaremos reféns da incerteza. É engraçado, pois o cérebro humano parece induzido por uma tentação incontrolável de sistematizar o desconhecido; simplesmente não aceitamos a indefinição, a ausência de resposta lógica, e então nos colocamos a elaborar teorias, a arriscar explicações para os fenômenos que nos rodeiam, buscando um padrão objetivo de sequência dos eventos e considerando que padrões necessariamente se repetem, uma vez que o universo é regido por leis estáticas. Segundo Taleb, sempre que arriscamos previsões e não deixamos margens para um evento inesperado, ou que projetamos o futuro baseado no passado, estaremos frágeis. Matematicamente falando, isso quer dizer que não podemos considerar que algo não irá acontecer apenas porque não tenha acontecido anteriormente. Ou seja: a probabilidade estimada de nada, e absolutamente nada, pode ser zero, pois estimativas requerem uma margem de erro. Toda vez que leio Taleb fico com a sensação de que apostar no improvável pode ser mais coerente (além de ter payoff mais alto), e que a contingência, questão já abordada filosoficamente com diversos nomes (incerteza, aleatoriedade, fado, fortuna…), parece ser a verdadeira força motriz dos eventos determinantes da história. Assim, desdenho sorrindo do meteorologista e sua tara por quantificar eventos futuros, enquanto aprendo a respeitar o índio que, impassível olhando ao céu, sabe-se refém da própria sorte.

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Nietzsche e a impotência da linguagem

Nietzsche foi um crítico da linguagem. Sabiamente percebeu que ela só é capaz de generalizar, simplificar o mundo e falsificar o real. Pascal disse parecido em torno da mesma lógica: a essência, ou o conhecimento, não está passível de ser posto em palavras — ou apreendido. Para Nietzsche, a linguagem é uma tradução, e nosso aparato cognitivo não nos dá senão uma perspectiva da realidade, ou seja: não somos capazes de definir a coisa em si, e saber é questão de interpretar e buscar o domínio do caos da aparência. Muito bem! Pois que eu olho em redor e só vejo convicções, verdades, opiniões sensatas, interpretações fundamentadas, conclusões empíricas, tudo isso envolto num maniqueísmo absoluto. Cautela e dúvida, hoje, são sinais de fraqueza e falta de preparo. Por isso — e por outras — reconheço minha absoluta incompatibilidade para com meu tempo e meu profundo desprezo para com as pessoas em meu redor.

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Esperança: o aguardente santo

Se, por um lado, a esperança é a estupidez suprema, “a apólice do pobre”, a “erva daninha que come todas as outras plantas melhores” — parafraseando Machado de Assis, — por outro a esperança é, de fato, virtuosíssima, indispensável, de modo que, abstendo-nos dela, a vida facilmente se nos afigura insuportável. E então? Que decidir? Que fazer deste aguardente santo? Tomá-lo ou não? Naturalmente, cada qual deve sorver a quantidade que mais lhe apeteça — tratando a abstinência e a gula, como sempre, de apontar-nos quem são os imbecis.

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Chineses e a vaidade

Sou, há quase uma década, vizinho de porta de uma família chinesa. Acabei, por esse motivo, tendo a oportunidade de conhecer e conversar com mais de uma dezena de chineses. E de um tempo para cá, sem nenhuma razão aparente, passei a articular: parece-me — posso muito bem estar enganado… — que o chinês, via de regra, é menos vaidoso que o ocidental. Aprofundando-me a investigação, descobri que na China não há, por exemplo, debate político. Vejam só! Sempre pensei que um mundo sem debates políticos seria menos arisco e que, sumariamente, todo debate de ideias é, antes, uma guerra de vaidades. Pois que o chinês comum não sente a menor necessidade de ver debatedores disputando inteligência, provando ao público a sensatez das próprias ideias! E o chinês comum não liga o rádio para ouvir o comentarista político a dizer: “Tenho a melhor análise!”, ou para ouvir o comentarista econômico a prever: “Tal medida falhará!”. O chinês comum, parece-me, faz cuidar da própria vida; e a China, parece-me, não caminha quase a estourar em debates, polêmicas, vendo verter o ódio a qualquer lugar que se olhe, com seus cidadãos em rixa, agressivos uns com os outros, quase a se matar por opiniões pessoais estúpidas a respeito de assuntos que, não bastasse o desconhecimento, não lhes guardam a menor possibilidade de ação efetiva. Por um momento, julgo o chinês comum superior ao maior de nossos eruditos.

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