Aquele que se afunda em estoicismo…

Aquele que se afunda no estoicismo, nos moralistas franceses, na filosofia oriental e, especialmente, em Schopenhauer, deveria prestar uma única homenagem à sua humanidade sepultada: permanecer em silêncio e nunca, jamais expor a filosofia aprendida a um ser humano comum. É perfeitamente possível que se alcance a anulação do sentimento e o despego, a indiferença completa para com o mundo exterior; mas é preciso ser canalha para não experimentar um insuperável remorso após inocular tais filosofias numa mente inocente. Têm elas o poder de arrasar após causar um choque atrocíssimo para o qual não há cura nem volta. A imensa maioria das pessoas não está preparada e não merece ter a inocência destruída pelo peso de tais reflexões.

Nada há de menos poético e divino que o remorso

Nada há de menos poético e divino que o remorso, essa dor lancinante e invencível que se instala para machucar. Experimentá-lo é permitir que negreje a mente e a vista não capte senão o desagradável em tudo. É ele como uma força densa que puxa o espírito para baixo em todas as circunstâncias. Curioso confrontá-lo com a repetida recomendação budista de romper e destruir completamente os laços. Não me lembro tê-los visto discorrer sobre o remorso resultante do sofrimento gerado por tal operação. Talvez, estar-lhe-ão com efeitos e cura previstos nesta via infinita do aniquilamento de si mesmo. Não estou certo de que tal via conduza ao nirvana quando percorrida até o fim; sem dúvida, porém, sei que monstros ela é capaz de produzir…

Uma vez absorvida, a filosofia de Schopenhauer…

Uma vez absorvida, a filosofia de Schopenhauer permanece como uma lâmpada negra da qual a mente não consegue se desviar. Há nela um magnetismo, uma atração sombria que faz questão de sempre atrair atenção para si. E então ela se mostra, sempre sábia, verdadeira e desagradável, como impelindo com argumentos irrefutáveis a conduta preconizada pelo seu criador. Diga-se quanto se quiser de Schopenhauer, mas não se pode negar-lhe a força.

O moralista é alguém que engole pedras

O moralista é alguém que engole pedras e, não podendo digeri-las, sente-as a rasgá-lo por dentro num percurso doloroso que se converte em gemidos literários. Deles nada se ganha, a não ser a constatação de que ocorreram e novamente ocorrerão. Nada pode o moralista contra as pedras, e parece haver algo em si que o impele a comê-las uma e outra vez.