Apesar do grande risco de degeneração…

Apesar do grande risco de degeneração inerente às relações humanas, deve ser, mesmo, uma grande satisfação participar de um ambiente de intercâmbio cultural, tal como os que houve e os que há em diferentes países, onde um pequeno grupo de intelectuais com comunhão verdadeira de interesses conversam, ensinam, aprendem, se ajudam e se desenvolvem. O que mais parece benéfico, e nem sempre ocorre, é o contato entre diferentes gerações, que possibilita a transmissão pessoal de um legado, o que deve ser igualmente satisfatório para aqueles que o transmitem e aqueles que o recebem. Em verdade, é o que poderia ser realizado pelas universidades, se estas não se tivessem metido em tantas formalidades. Não se pode subestimar o valor da presença física, — ausente nos livros, — e, portanto, a cultura deve muito a estas pequenas associações informais.

Analisando a minha obstinação…

Analisando a minha obstinação com aqueles temas que dão as notas mais insuportavelmente pessimistas de minha ficção, a saber, a violência, a insegurança, a feiura do ambiente e a incultura como norma, vejo que, instintivamente, acabo acertando aquilo que mais se distingue e mais importa nas últimas décadas. Nada há de original em nenhum destes temas; contudo, a virulência com que eles se impõem no cotidiano atual, todos eles de alguma forma interligados, e todos eles com ramificações incalculáveis, é algo que há algumas décadas não poderia ser retratado, por não corresponder à realidade. E mais importa fazê-lo agora porque mais se tenta ocultar o quão deprimente é o estado em que o Brasil se meteu. Não é possível olhar tudo isso sem o máximo espanto: um país que objetivamente alia as maiores taxas de homicídio com os piores níveis de educação do planeta… Dizê-lo e retratá-lo é, mesmo, desagradável, e não pode senão despertar antipatias. Mas alguém tem de fazê-lo, ainda que por consideração às vítimas desta catástrofe.

A mitologia grega é mesmo fascinante…

A mitologia grega é mesmo fascinante. E mais a estudamos, mais ficamos impressionados com o painel vastíssimo de condições humanas que ela encerra. Ficamos, aliás, com a sensação de que não há sentimento, não há destino humano que não encontre ali um modelo. E as demais criaturas singularíssimas, as cidades e cenários fantásticos, é tudo demasiado vivo e estimulante para a imaginação. Contudo, há de se notar que, a despeito de todo o esplendor da mitologia grega, parece o seu universo carecer de uma divindade que não se resuma a uma espécie de homem com poderes sobre-humanos. Se é isso o que buscamos, temos de procurá-lo em outro lugar.

A delícia na escolha das rimas

Em meio a agruras intermináveis, não há negar que o fazer poético guarda certa delícia na escolha das rimas, na escolha e na posterior constatação de seu efeito. Não importa o quanto se mecanize o processo, a descoberta de uma rima inesperada é sempre prazerosa e estimula sobremaneira, chegando a tornar-se um como vício que não faz senão mais e mais atrelar o poeta à linguagem. Afinal, é um vício que acaba produtivo e, uma vez experimentado, faz impressionar sobre a indiferença com a qual alguns poetas o repeliram.