No fenômeno da psicografia, nada impressiona tanto quanto a indiscutível qualidade literária de alguns textos, que justifica inteiramente o processo. A inteligência que se expressa com elegância e clareza prova-se, pela forma, merecedora de atenção. A expressão a sustenta e reclama o direito de apreciação zelosa, isenta de prejulgamentos, tal como se deve fazer com todo aquele cuja lucidez patenteia haver, no mínimo, ela mesma a se transmitir.
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Somente dois momentos prazerosos
Na criação poética, talvez haja somente dois momentos prazerosos: o da ideação e, naturalmente, o da conclusão. O primeiro resume-se à ilusão, o segundo ao alívio. No restante do processo, não há senão luta e mais luta. Acerta-se um verso, mas a satisfação de um átimo desaparece perante a necessidade de acertar também o seguinte. Assenta-se a ideia, mas carece o verso de rima; coadunam-se ideia e rima, mas o ritmo desagrada. E assim sucessivamente, e isso somado à necessidade de encontrar palavras que, quando precisas, não se ajustam às necessidades do verso. O processo se assemelharia à montagem de um quebra-cabeça, não se tratasse este de matéria inócua a ser concatenada, não se tratasse este de um passatempo em cujo sucesso ou fracasso o praticante exime-se de consequências existenciais.
“O ordálio mais tremendo”
É sem dúvida impressionante que Carpeaux tenha dito, em entrevista, considerar o fato de ter aprendido “mais ou menos” a língua portuguesa “o ordálio mais tremendo a que a vida me submeteu”. Quer dizer: tal foi dito por um eruditíssimo poliglota, versado em praticamente todas as línguas europeias: algo que evidencia a imensa barreira que há entre estas e o português. Credita Carpeaux ao seu conhecimento de latim o conseguir adaptar-se ao novo idioma, e disso se pode inferir que a sintaxe vernácula apresenta complicações terríveis a um moderno não versado nas línguas antigas. E além disso, a prosódia, os indomáveis e imprevisíveis fonemas, a ortografia confusa, e por aí vai. A dizer a verdade, talvez seja algo assaz positivo o ter-se em português preservado grande parte do brilho da sintaxe latina; contudo, não se pode negar que o correr dos séculos demonstra que o português, ao contrário das demais línguas europeias, afastou-se em vez de aproximar.
A importância de Péricles Eugênio da Silva Ramos
A importância de Péricles Eugênio da Silva Ramos para a versificação portuguesa ainda não foi devidamente estabelecida. Seus ensaios estão entre o que de melhor já se escreveu sobre o tema, e é curioso observar que todos eles resumem-se à exposição de observações decorrentes de um estudo sério. Dizendo assim, parece pouca coisa; mas há ensaios que, em cinco páginas, esclarecem e desfazem o erro de outras tantas centenas que integram o acervo da língua portuguesa. Estudar e divulgar as descobertas do estudo: uma fórmula simples que, pela repetição sistemática, colocou Silva Ramos entre os mais importantes estudiosos da poesia portuguesa.