Em arte, o traço que talvez mais impressione e mais caracterize verdadeiros gênios é a multiplicidade. Se tomamos de exemplo um Fernando Pessoa ou um Shakespeare e lhes analisamos a obra, parece-nos incrível que manifestações tão variadas tenham saído de uma mesma mente. Quer dizer: se, enquanto lemos, nos atentamos não para a obra, mas para a mente que a gerou, buscando compreender-lhe as motivações e os intentos, ficamos impressionados ao notar como comporta oscilações por vezes antagônicas, e como logra expressá-las límpidas e potentes. É como se, confrontando-a com uma mente comum, notássemos que, de um lado, há um caráter vicioso e tíbio, e, de outro, há uma potencialidade criativa sem limites.
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Temáticas atemporais
Particularmente, restrinjo-me a arte a temáticas que julgo atemporais. Isso, noutras palavras, quer dizer que recuso-me terminantemente a uma análise pormenorizada dos valores deste tempo, por não desejar infestar-me a literatura de uma moral tão torpe e desprezível. Farão bem no futuro se jamais derem atenção às correntes sociológico-morais que este século pariu, que não passam de ideologias vergonhosamente infames, lapsos estúpidos na história do pensamento humano.
Compromisso gravado na pedra
A vantagem destas notas é que através delas posso metodicamente captar e registrar impressões efêmeras que experimento enquanto leio, durmo ou componho, e que provavelmente seriam desperdiçadas. Por outro lado, já divirto-me porque sei, enquanto as lapido, que amiúde estou a precipitar-me. Não interessa. Leio uma passagem, tenho uma ideia: essa ideia irá converter-se em nota; é este um compromisso já gravado numa pedra imaginária. Analisando friamente, creio que sejam estas linhas em prosa a concretização de um método rigoroso de aproveitamento mental.
Ah, se eu quisesse…
Ah, se eu quisesse fazer parte de um clube, de uma “escola”, de uma congregação! Após tomar conhecimento da existência de Antero, — quem eu poderia fantasiar, inclusive, como existência passada, visto o quanto tenho-me catequizado nestas filosofias, — eu me poderia facilmente incumbir de “continuar o que ele não terminou”, “resgatando” os seus “valores”, buscando-lhe os discípulos coevos a mim, etc., etc. Por isso, talvez, eu jamais pudesse ser Antero — alguém que martirizou-se cedendo às recaídas desse sentimento que, para uma mente incomum como a sua, deve ser exterminado em prol da paz.