O moldar-se psicologicamente não é senão centrar-se em objetivos a serem alcançados por esforço mediante estimulações conscientes. Moldar-se, embora possa ser visto como aperfeiçoar-se, corrigir-se ou transformar-se, em suma encerra um processo em que o consciente digladia por afirmação. Define prioridades, propõe-se ação, policia-se e, com o tempo, consegue o que quer. O problema, porém, é que a mente humana é tanto mais efetiva quanto mais focada trabalhe. Disto procede-lhe uma dura limitação: por efetividade, tem de concentrar-se em fins específicos, tem de focalizar-se a atuação. Assim triunfa, mas triunfa numa parte reduzida de seu escopo. Com o tempo, o esforço transforma-se em hábito, a ação consciente automatiza-se, abrindo espaço para que novos enfoques sejam definidos. Mas o tempo é-lhe limitado… Em resumo: pode moldar-se, mas num moldar-se que define-lhe as proeminências, os ressaltos que lhe são mais importantes — e tem de resignar-se com as próprias limitações sabendo que, necessariamente, terá de lidar com uma parte incômoda e atrofiada de si mesma.
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Grande parte das “descobertas” modernas nada tem de descobertas
É curioso notar como grande parte das “descobertas” modernas nada tem de descobertas. No terreno da psicologia, é dificílimo encontrar algo relevante que já não esteja esboçado — e amiúde melhor esboçado — nas obras de Doistoiévski e Nietzsche, para não mencionar os textos orientais. Mas o “desafio do urso polar” de Dostoiévski, ou a constatação de Nietzsche de que “as melhores ideias surgem ao caminhar”, em vez de serem imediatamente captadas pela intuição, tiveram de esperar um século para que fossem devidamente validadas por experimentações ociosas. A miséria deste tempo é exigir que tudo contenha-lhe o selo distintivo; do contrário, não tem valor. Assim parecem os esforços direcionados mais a afagar uma vaidade coletiva que a ampliar a extensão de quanto se pode chamar conhecimento do homem.
As melhores decisões surgem após meditação longa…
As melhores decisões surgem após meditação longa, embora disforme, que concentra-se lentamente até um ponto em que extravasa com violência num impulso que, por ação volitiva, tem a vazão permitida de imediato: concretiza-se neste impulso, e perdura frutificando. A intuição, tomada no sentido junguiano, quando desenvolvida é capaz de manifestar-se carregada de uma certeza que sobrepuja o raciocínio. É o clarão de uma faculdade preciosa. Contrariá-la, nestes casos, é malbaratá-la. Por isso é justa a paciência em decisões importantes — mas, por vezes, o mais proveitoso é ter coragem para seguir a própria intuição.
Neurociência e arte
Feliz surpresa o meu descobrimento das conclusões a que tem chegado a neurociência através da encefalografia. Todas elas corroboram quanto, pela experiência, tenho definido como metodologia de trabalho ideal. E há muito, muito para se conjeturar… Dizem-nos os neurocientistas que, no estado de atividade normal do cérebro, quando desperto, há predominância na emissão de ondas denominadas beta, assim como na execução de atividades que exigem alta concentração. Em contrapartida, em estado de relaxamento, reflexivo ou meditativo, pode haver no cérebro predominância na emissão de ondas de menor frequência, as chamadas alfa. O mais interessante — embora não seja novidade — é terem notado os neurocientistas uma relação entre emissão de ondas alfa e diversas manifestações cerebrais, como a criatividade. Essas observações vêm em amparo da seguinte teoria: na arte, há dois momentos distintos do processo criativo: o da ideação e o da realização. É presumível que, realizando a obra, predomine no cérebro do artista a emissão de ondas beta, posto esteja fortemente concentrado nos detalhes daquilo que está a criar. Não é, portanto, o momento em que brilharão as melhores ideias para a obra, se estão corretas as observações da neurociência. Destarte, é preciso que o artista defina um momento distinto para concebê-las ou, noutras palavras, que distribua em etapas o esforço cerebral, a fim de explorá-lo de forma mais inteligente. Não disseram os neurocientistas o que repito: a criatividade não funciona, no cérebro, como a execução de tarefas precisas; isso quer dizer que não se pode obter resultados imediatos e com a mesma regularidade ao estimulá-la. Mas se pode, certamente, estimulá-la de forma metódica, deixando-a trabalhar em seu tempo. É por isso que ao artista cuja rotina encerra regularmente estados semimeditativos, explosões criativas estão muito distantes de manifestações de Deus.