Uma psicologia que submeta o inconsciente a estímulos externos…

Uma psicologia que submeta o inconsciente — e consequentemente a personalidade — a estímulos exclusivamente externos pode até ser efetiva e aplicável ao homem comum, mas nunca será apropriada ao modelo humano superior. Nisto reside uma clara limitação da psicanálise. É verdade que a experiência, o meio e o resto deixam marcas, mas estas podem ser ínfimas se comparadas às do raciocínio na mente que aprendeu a menosprezar o exterior e especializou-se em pensar. Neste caso, traça-se como uma linha divisória entre seus primeiros anos e o momento em que descobriu a própria faculdade. Descobrindo-a, passa a exercitá-la numa análise comportamental minuciosa, que julga-se validando ou invalidando o que motiva-lhe o agir. Depois, opera uma remodelação — ou aprimoramento — da própria personalidade, em que estímulos internos passam ocupar o inconsciente. O resumo: o ser liberta-se das correntes psicológicas — caso as haja — e constrói-se, tornando-se quem deliberadamente deseja ser. Buscar no passado as justificativas para o comportamento de um ser como este, tirando-lhe a responsabilidade de agir como age ou ser como é, é mostrar-se absolutamente incapaz de compreendê-lo.

Os efeitos sempre corruptores e opressivos da psicologia de grupo

Analisando os efeitos sempre corruptores e opressivos da psicologia de grupo, pode-se concluir que a honra exige a solidão — isto é, a recusa terminante em integrar qualquer coletividade. O pensamento coletivo é detestável, a imposição coletiva sobre o indivíduo infame. Mas o caminho é ingrato: há sempre um preço a pagar. A sociedade, com seu histórico vergonhoso de perseguição contra os rebeldes solitários, negando-os a possibilidade da recusa, submetendo-os sempre à sua tirania vil, não pode ser melhor definida senão como a manifestação espraiada do mal. Não espantaria descobrir que quem rege este mundo coloca defuntos para acordar dentro do caixão.

Velhice, doença e morte…

Velhice, doença e morte; velhice, doença e morte: as obsessões que pavimentaram o caminho de Buda rumo à “iluminação”. Mais do que olhos abertos, é preciso coragem para confrontá-las. Buda compreendeu que nada vale o pensamento que não incorre em ação: do raciocínio extraiu filosofia, desta pautou-lhe a conduta. Velhice, doença e morte: tudo o que vive condenado ao suplício, ao esgotamento e à supressão. Quer sempre a mente iludir-se; pois que padeça, amargue diariamente as conclusões do juízo, até que tenha de si arrancadas todas até a última ilusão! E assim, ensina o arguto e iluminado psicólogo, escapa-se do ciclo maligno que redunda sempre em sofrimento e destruição.

A misantropia é um dos traços mais salutares ao raciocínio que se tem notícia

A misantropia é um dos traços mais salutares ao raciocínio que se tem notícia. Ser misantropo envolve um esforço contínuo e desafiador. Quando se é misantropo, o sujeito torna-se um estrategista por necessidade. Aprende psicologia para entender a mente dos outros, para então lhes prever o comportamento e ser capaz de evitá-los. Tem de ser especialista em estímulos emocionais para saber não suscitar nunca nenhum em ninguém. O misantropo sabe que sua sagacidade será inversamente proporcional ao desconforto proveniente das relações sociais; portanto, quanto mais sagaz, mais plenamente alcançará o objetivo de reclusão. O interessante é que o estímulo nunca cessa, o cérebro do misantropo é instigado o tempo inteiro e jamais descansa, posto sempre haver a possibilidade de alguém interromper-lhe a solidão e solicitá-lo para qualquer coisa. É como um jogo interminável, extremamente salutar à inteligência e que, mais do que qualquer outro jogo, atiça a vontade de ganhar.