Em páginas de Umberto Eco, deparo-me com este problema tão comum e insistente, que tanto afligiu desde Nelson Rodrigues a Andrei Tarkovski, o próprio Umberto Eco e outros tantos, que é a cobrança de explicações sobre a própria obra. Umberto Eco resume, em minha tradução direta:
Um narrador não deve fornecer interpretações da própria obra, caso contrário não teria escrito um romance, que é uma máquina geradora de interpretações.
Creio o “romance” se aplicar a qualquer obra artística. Interpretar não é da alçada do autor, nunca foi e jamais será. Exigir do artista qualquer justificativa é não menos que tentar destruir-lhe a obra.
A situação é engraçada, porquanto é justamente a interpretação que todos, desde o leitor até o crítico, parecem exigir do autor.
Tarkovski, com sua montagem não linear e suas cenas de teor altamente subjetivo e poético, revela-se em Esculpir o tempo alvo de inúmeras cartas indignadas e ofensivas de espectadores simplesmente lhe exigindo explicações.
Nelson Rodrigues, por sua vez, passou a vida a ter de justificar por que os outros censuravam suas obras, quando obviamente nada tinha que ver com as interpretações de suas cenas.
A lista se estende ao infinito: dramaturgos, romancistas, cineastas… muitos e muitos alvos da mesma noção infesta de que o autor deve explicações ao público.
É triste saber dissolvido o sentido da arte, saber que o público desconhece por completo a essência de uma obra artística e julga o artista como a um panfleteiro, alguém que deseja lhe provar a opinião ou lhe angariar alguma concordância.
Entretanto, há o lado positivo e talvez muito, muito positivo. Tomando conhecimento da própria sina, o artista saberá traçar a distância ideal que deve tomar do público, blindando-se, assim, e salvando a sua obra.
____________
Leia mais: