A língua carece de uma obra

Notando a confusão terrível em que se encontram, ainda hoje, alguns conceitos da versificação portuguesa, como a “cesura” e o “encadeamento”, sendo a primeira utilizada para exprimir desde tonicidade à divisão silábica, incluindo usos mais criativos como “o repouso da voz sobre uma sílaba”, e a segunda para expressar tanto o chamado cavalgamento como a repetição de fonemas, frases ou até versos inteiros, concluímos que a língua carece de uma obra que seja capaz de esclarecer tais e outros conceitos. Os tratados de Castilho, Bilac e Guimarães Passos são incompletos por não dedicarem uma linha ao ritmo — curiosamente, o que há de mais importante na poesia; — outros há que, embora devam ser reconhecidos pela intenção, lamentavelmente não compreenderam ou compreenderam incorretamente muitos aspectos básicos da poesia. Duque-Estrada e Bandeira, grandes versificadores, produziram obras de bolso, pouco abrangentes. Said Ali brilhantemente expôs uma interpretação nova à versificação portuguesa, mas sua obra não é capaz de instruir, do zero, um iniciante, posto que se escusa a estender-se em muitos conceitos que ao autor pareciam óbvios. Disso tudo parece a língua carecer não de um tratado com regras, mas de uma obra que simplesmente clarifique conceitos básicos e reúna o que há de positivo desde Castilho, sendo um apoio seguro para aqueles que desejam fazer versos. Como é possível não havê-la?