A publicidade, como a polêmica…

A publicidade, como a polêmica, é dispensável em literatura e requer uma predisposição. A partir do momento em que se entra neste jogo, é preciso ter talento para não se desviar e não se corromper. Imaginar um Kafka, por exemplo, lidando com tais protocolos é impossível. Ao pensar em seus escritos nas mãos do grande público, Kafka julgou mais conveniente queimá-los, e isso demonstra que, fosse forçosa a publicidade, jamais escreveria o que escreveu. É, mesmo, questão de vocação o perdurar com a seriedade e sinceridade diante de uma plateia qualquer.

Às vezes parece que essa necessidade crítica…

Às vezes parece que essa necessidade crítica aglutinadora, que se dá com a finalidade de apresentar uma visão histórica panorâmica dos rumos tomados pela literatura, mais prejudica do que facilita a compreensão dos autores. Quer dizer: se para autores menores a aglutinação funciona, para os grandes ela parece falseá-los, e ficamos com a impressão de que muito melhor seria, em vez de enquadrá-los numa coletividade, simplesmente confrontar-lhes vida e obra, como é feito com notório sucesso nalgumas biografias. O que salta aos olhos é que a crítica, às vezes, para explicar o conjunto, deforma completamente o individual.

Quando se segue a recomendação…

Quando se segue a recomendação de Ortega y Gasset, de Viktor Frankl e de Louis Lavelle, os quais, sob prismas diferentes, ressaltam a importância de buscar a integração da circunstância individual no plano da existência, o ato adquire, decerto, uma solidez extraordinária, e a vida embebe-se de seriedade. Mas há, aqui, um problema inevitável, o de que às vezes a circunstância é tão miserável e deprimente, que sua assimilação chega a ser perigosa. Quer dizer: aquele que deseja mirar e compreender a realidade crua, se tomado por este senso de responsabilidade perante a circunstância, não pode fazê-lo jamais como um observador distanciado e imparcial. O que chama para si é aquilo que sofre, o que busca integrar é aquilo que o estorva, pressiona, deprime. O que faz é o contrário da vereda racional do distanciamento, e esta tarefa nunca é empreendida sem deixar profundas marcas no caráter. O resultado pode não ser nada bom…

Profetizou Dostoiévski…

Profetizou Dostoiévski, e hoje o exibicionismo entranhou-se nos costumes de tal maneira que o não praticá-lo é escandaloso. O maior mal derivado deste comportamento é a noção comum de que aquilo que não é exposto, não é; que para ser, tem de ser compartilhado. E então se dá aquela velha história de que a mentira, impulsionada pelo crédito, torna-se verdade: aquele que nela acredita acaba, de fato, sufocando a sua dimensão interior.