O silêncio de Machado de Assis

Alvo de numerosas críticas sendo algumas, em verdade, ataques invejosos, Machado de Assis, em toda a sua vida, silenciou-se a respeito. Mereciam resposta? ou antes: cabe ao artista responder as críticas que lhe são direcionadas? Sem dizer uma única palavra, Machado nos ensinou como o grande artista deve portar-se. Atacado, o mestre conservou-lhe a independência, continuou a trabalhar. E se as críticas expuseram qualquer problema estético ou expressivo digno de nota, pois que a resposta está claríssima em literatura. E para a grande massa dos comentários, bom, esses receberam o que lhes cabia: o desprezo.

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Inspiração: estimulação consciente do cérebro

Li não lembro onde, há alguns bons anos, um psicólogo a dizer que Bertrand Russell utilizava um processo interessante quando se envolvia em problemas complexos. Seria mais ou menos o seguinte: Russell pensava, com máxima concentração e força de espírito, no determinado problema; traçava-lhe as possíveis soluções, desmembrava-lhe em questões menores, formulava variadas hipóteses e buscava encontrar, em todas, as possíveis falhas. Ocupava-se-lhe inteiramente a cabeça com a questão por horas, às vezes dias, e então, quando se sentia esgotado, não publicava, sequer executava a redação final de suas conclusões: abandonava o problema e deixava-o descansar, ocupando-lhe a mente com qualquer outra coisa. Então, passados alguns dias, semanas ou meses, subitamente a mente apontava-lhe a solução, que vinha como uma violenta avalanche e, assim, Russell sentava-se a escrever. Que seria isso, inspiração? Se for essa a palavra, então será forçoso adicionar que nela não há nada de divino, fantástico ou sobre-humano. O que há é método, estimulação consciente do cérebro. E se o cérebro, pois, às vezes não entrega resposta imediata, não quer dizer que não funcione, ou que não esteja a trabalhar. Da mesma forma que, quando decide ferver em momento inoportuno, não está a fazer nenhum tipo de mágica ou exibir poderes sobrenaturais…

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O insuportável “eu”

Espero, senão nestas notas, jamais grafar essa palavra insuportável — “eu” — em primeira pessoa. Julgo engraçado como, ainda aqui e exatamente agora, conjugo os verbos na primeira de forma repetitiva, quando ninguém menos que eu mesmo nutro repugnância categórica por essa obsessão moderna com o próprio ser e julgo-me a singularidade mais insignificante de todo o universo. Entretanto, cá estão as justificativas e a confissão: (1) o “eu”, nestas notas, nunca será senão um apelo expressivo rasteiro, quando o objeto destas linhas é inteiramente outro — confessando, espero expulsar a palavra intrusa; — (2) se um dia, e imploro que não aconteça, mas se um dia o “eu” tomar o caminho inverso e passar a ocupar o centro destas notas, então me terei esgotado enquanto artista e enquanto explorador de questões que extrapolam minha realidade mesquinha. É esperar para ver…

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Ser ou não ser o que de fato somos

Vamos da abertura do excelente ensaio Banquete de ossos, de Bruno Tolentino, publicado em 1998 e atualíssimo:

À beira das comemorações do Manifesto Antropófago, dentre os mais supervalorizados subprodutos paulistanos, meditemos no pobre estado de nossa linguagem. Passemos sobre a confusão de nossas idéias, coisa herdada dos subprodutos do neopositivismo oitocentesco, já que, no primeiro caso, o problema é bem mais recente, produzido para nós para uso e abuso doméstico e, portanto, reparável por uma difícil, mas urgente, restauração da língua que nos foi legada pelo colonizador à sua dignidade original, isto é, lusitana com muita honra! Não somos uma variante afro-cafuza da lusofonia, nosso dilema não é “tupi or not tupi”, é, ainda e sempre, ser ou não ser o que de fato somos: uma grande e sempre por si mesma renovada civilização lusófona.

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