Frequentemente o que motiva a misantropia…

Frequentemente o que motiva a misantropia é não a total repulsa pelo que há de mau no homem, mas uma divergência de interesses. Dizendo desta forma, parece pouca coisa; mas há divergências que, por tão completas, fazem com que o contato seja sempre estorvo, sempre perda de tempo, quando não aborrecimento. E então torna-se penosa a busca por um ponto de contato sabidamente inexistente. Sem ele, não há relação humana possível, e se não pode havê-lo, buscá-lo resume-se, como diz a expressão popular, a dar murros em ponta de faca.

O que há de valoroso nos teosofistas…

O que há de valoroso nos teosofistas, ao menos a princípio, não é o sincretismo da doutrina que professam, mas o impulso inicial por estudar e compreender diferentes doutrinas, buscando nelas o que há de verdadeiro e bom. É, em suma, aquela velha humildade perante o desconhecido, aquele interesse genuíno pelo alheio, que começa pela concessão de um crédito manifesto na boa disposição para ouvir. Tão evidente e tão básico. Se a teosofia ensinasse essa única virtude aos homens, já se teria mostrado de grande valor. Todo o resto são lamentos.

É difícil imaginar um combustível mais efetivo…

É difícil imaginar um combustível mais efetivo ao ódio que o dogmatismo. Poder-se-ia dizer, até, que o ódio não se completa, não se manifesta com perfeição e intensidade máxima desprovido de tal elemento. Porque se faz algo o dogmatismo é determinar, consolidar, enrijecer. E quanto mais determina, quanto mais consolida, quanto mais enrijece, maior a aversão pelo que fica de fora, incluindo o que simplesmente desconhece. Afinal, o dogmatismo dota o ódio de suas notas mais extremadas, especialmente por irracionais.

Tornou-se corriqueiro dizer da preguiça…

Tornou-se corriqueiro dizer da preguiça o principal vício do caráter brasileiro. Nada mais falso! Este posto pertence à maledicência, e a uma maledicência suprema e sui generis. No Brasil, tal vício não remonta como noutras bandas simplesmente à inveja. A maledicência, aqui, começa pelo hábito, pelo impulso incontrolável, inato e cotidiano de falar da vida alheia, algo desde logo detestável. Disso para maldizer, contudo, há uma distância que só pode ser preenchida por uma infâmia mais profunda: a inveja, sim, mas também a covardia, a necessidade de aceitação, a mesquinhez desmedida, a ausência de personalidade, como muitíssimo bem retratado por Orígenes Lessa. Talvez seja mais simples colocar a questão da seguinte maneira: o maldizente brasileiro não deseja as qualidades do objeto de seu maldizer; ele deseja, pelo contrário, que este as perca e desça ao seu nível miserável; maldiz, pois, não por um “querer valorizar-se”, mas para amesquinhá-lo, algo só possível num espírito que desceu ao mais baixo entre os círculos da mediocridade.