O grande problema humano é o haver ou não propósito

O grande problema humano é o problema de sentido, o haver ou não propósito. E não são a vida e obra humanas senão a resposta. Essa simples questão ultrapassa todas as outras, atravessa a realidade nos mais íntimos detalhes. Já quando tudo parece bem, já quando a fortuna decide exibir-lhe o chicote, o problema resta evidente, sempre à espera de resposta: para quê? Pensando nisso temos, pois, a ferramenta necessária para medir-nos a dimensão, avaliar-nos a existência e decidir, sozinhos, o que devemos ou não fazer.

____________

Leia mais:

Inspiração: estimulação consciente do cérebro

Li não lembro onde, há alguns bons anos, um psicólogo a dizer que Bertrand Russell utilizava um processo interessante quando se envolvia em problemas complexos. Seria mais ou menos o seguinte: Russell pensava, com máxima concentração e força de espírito, no determinado problema; traçava-lhe as possíveis soluções, desmembrava-lhe em questões menores, formulava variadas hipóteses e buscava encontrar, em todas, as possíveis falhas. Ocupava-se-lhe inteiramente a cabeça com a questão por horas, às vezes dias, e então, quando se sentia esgotado, não publicava, sequer executava a redação final de suas conclusões: abandonava o problema e deixava-o descansar, ocupando-lhe a mente com qualquer outra coisa. Então, passados alguns dias, semanas ou meses, subitamente a mente apontava-lhe a solução, que vinha como uma violenta avalanche e, assim, Russell sentava-se a escrever. Que seria isso, inspiração? Se for essa a palavra, então será forçoso adicionar que nela não há nada de divino, fantástico ou sobre-humano. O que há é método, estimulação consciente do cérebro. E se o cérebro, pois, às vezes não entrega resposta imediata, não quer dizer que não funcione, ou que não esteja a trabalhar. Da mesma forma que, quando decide ferver em momento inoportuno, não está a fazer nenhum tipo de mágica ou exibir poderes sobrenaturais…

____________

Leia mais:

O insuportável “eu”

Espero, senão nestas notas, jamais grafar essa palavra insuportável — “eu” — em primeira pessoa. Julgo engraçado como, ainda aqui e exatamente agora, conjugo os verbos na primeira de forma repetitiva, quando ninguém menos que eu mesmo nutro repugnância categórica por essa obsessão moderna com o próprio ser e julgo-me a singularidade mais insignificante de todo o universo. Entretanto, cá estão as justificativas e a confissão: (1) o “eu”, nestas notas, nunca será senão um apelo expressivo rasteiro, quando o objeto destas linhas é inteiramente outro — confessando, espero expulsar a palavra intrusa; — (2) se um dia, e imploro que não aconteça, mas se um dia o “eu” tomar o caminho inverso e passar a ocupar o centro destas notas, então me terei esgotado enquanto artista e enquanto explorador de questões que extrapolam minha realidade mesquinha. É esperar para ver…

____________

Leia mais:

O cume é vizinho natural do abismo

Há um notável problema proveniente da ascendência e resume-se basicamente nisto: o cume é vizinho natural do abismo. Poderia formular de outras maneiras, dizendo que quando se chega ao topo, o movimento só é possível para baixo, ou que a distância do pico ao precipício é qualquer deslize… Penso, agora, em Julien Sorel, mas os exemplos são inúmeros. Por que, exatamente, o destaque nos torna tão vulneráveis? Inveja? Pelo desejo que, por sua natureza, nos expõe? Não posso deixar de notar o potencial destrutivo da ascensão, as provações que esta normalmente exige e seu prêmio enganoso, senão injusto. Racionalmente, a conclusão se impõe: talvez o mais sábio seja deixar imediatamente de escalar.

____________

Leia mais: