Há um curioso vácuo…

Há um curioso vácuo que se segue a atos cruentos, apaixonados, irrefletidos, em que o homem extrapola os limites da ética. Parece a consciência emergir questionando razões, quando já não é possível desfazer o que se fez. O vácuo se impõe, geralmente resultando em arrependimento dos desnecessários excessos. É cabido o cotejo com o déspota que, num rasgo de cólera, comete uma injustiça tão indevida quanto escusada. Então se nota que, nuns, é tal vácuo instrutivo; enquanto, noutros, parece legitimar a imoralidade e prenunciar excessos ainda piores.

O muro de concreto

É sempre um prazer refletir sobre estes momentos em que a expectativa choca-se em alta velocidade contra um muro de concreto, destruindo-se completamente. São poucos os lances tão propícios a uma reflexão justa, a um exame sensato da realidade como nestes em que o presente é a desilusão e o futuro desalentador. Talvez por isso o pessimismo seja, em filosofia, a postura mais consistente: pois quando se embasa em experiências tão fortes e tão patentes, mostra-se quase irrefutável. Momentos assim têm o poder de impor, de uma só vez, a humildade e o silêncio.

A inveja é invencível

A inveja é invencível. Talvez, entre todos os sentimentos humanos, somente ela possua esse caráter absolutamente inflexível. Poder-se-ia observá-la sob duas óticas: a de quem a exercita, e a de quem a sofre. O invejoso é um escravo deste sentimento que, se não estimulado, surge e robustece espontaneamente. Ainda que queira vencê-lo, não pode sem uma desfiguração de si mesmo; portanto, o mais que pode fazer é empreender um combate contínuo, e nele prosseguir a despeito das derrotas. Já o invejado, isto é, o paciente da inveja, que lhe resta fazer? Este, sem dúvida, encontra-se ainda mais impotente diante do problema, e parece nenhuma ação que porventura empreenda capaz de anulá-lo. Valha-se do desprezo, uma solução talvez razoável, e não fará senão desviar-se do natural incômodo que experimenta; não vencendo jamais o agente. Em resumo: a diferença, em ambas as perspectivas, parece simplesmente se reduzir a duas posturas: a daqueles que incitam, e a daqueles que evitam a inveja; ficando evidente, em ambos os casos, uma diferença tão somente de caráter, não de resultados.

A vida só parece monótona a quem não lhe presta a devida atenção

A vida só parece monótona a quem não lhe presta a devida atenção. Basta registrá-la para percebê-lo, caso os olhos abertos não sejam suficientes ou a memória falha. Esta é uma verdade que impressiona quando constatada: subitamente, parecem fazer sentido muitas singularidades aparentemente banais do passado, que passaram como despercebidas. Então, fica muito difícil não tender a uma interpretação quase mística da realidade, posto que imenso esforço se faz necessário para negar conotações ocultas que revelam-se realidades infinitamente mais plausíveis ao raciocínio. Em suma: a monotonia, o mais das vezes, é mera desatenção.