É difícil imaginar um combustível mais efetivo ao ódio que o dogmatismo. Poder-se-ia dizer, até, que o ódio não se completa, não se manifesta com perfeição e intensidade máxima desprovido de tal elemento. Porque se faz algo o dogmatismo é determinar, consolidar, enrijecer. E quanto mais determina, quanto mais consolida, quanto mais enrijece, maior a aversão pelo que fica de fora, incluindo o que simplesmente desconhece. Afinal, o dogmatismo dota o ódio de suas notas mais extremadas, especialmente por irracionais.
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A democrática destruição da superioridade
Outra de Guénon:
Cela dit, il nous faut encore insister sur une conséquence immédiate de l’idée « démocratique », qui est la négation de l’élite entendue dans sa seule acception légitime ; ce n’est pas pour rien que « démocratie » s’oppose à « aristocratie », ce dernier mot désignant précisément, du moins lorsqu’il est pris dans son sens étymologique, le pouvoir de l’élite. Celle-ci, par définition en quelque sorte, ne peut être que le petit nombre, et son pouvoir, son autorité plutôt, qui ne vient que de sa supériorité intellectuelle, n’a rien de commun avec la force numérique sur laquelle repose la « démocratie », dont le caractère essentiel est de sacrifier la minorité à la majorité, et aussi, par là même, comme nous le disions plus haut, la qualité à la quantité, donc l’élite à la masse. Ainsi, le rôle directeur d’une véritable élite et son existence même, car elle joue forcément ce rôle dès lors qu’elle existe, sont radicalement incompatibles avec la « démocratie », qui est intimement liée à la conception « égalitaire », c’est-à-dire à la négation de toute hiérarchie : le fond même de l’idée « démocratique », c’est qu’un individu quelconque en vaut un autre, parce qu’ils sont égaux numériquement, et bien qu’ils ne puissent jamais l’être que numériquement. Une élite véritable, nous l’avons déjà dit, ne peut être qu’intellectuelle ; c’est pourquoi la « démocratie » ne peut s’instaurer que là où la pure intellectualité n’existe plus, ce qui est effectivement le cas du monde moderne. Seulement, comme l’égalité est impossible en fait, et comme on ne peut supprimer pratiquement toute différence entre les hommes, en dépit de tous les efforts de nivellement, on en arrive, par un curieux illogisme, à inventer de fausses élites, d’ailleurs multiples, qui prétendent se substituer à la seule élite réelle ; et ces fausses élites sont basées sur la considération de supériorités quelconques, éminemment relatives et contingentes, et toujours d’ordre purement matériel.
Decerto, se algo alcançaram as democracias modernas, foi a imposição do número como critério supremo de valor, o que significa a destruição da superioridade qualitativa, ou simplesmente a “democratização”. Vale o indivíduo, o conhecimento, pelo que têm de igualitários, pelo que não os distingue. E assim tudo descai na mais completa farsa, posto que a igualdade só se realiza como atributo negativo, isto é, só há igualdade na carência passiva, e o menor esforço, o mérito mais insignificante é suficiente para eliminá-la. Como, pois, impraticável num mundo que se move, a “democratização” não tornou iguais os indivíduos, mas puniu violentamente o meritório, produzindo injusta e cinicamente uma espúria casta superior.
O conhecimento ignorante
De René Guénon:
La vérité est qu’il n’existe pas en réalité un « domaine profane », qui s’opposerait d’une certaine façon au « domaine sacré » ; il existe seulement un « point de vue profane », qui n’est proprement rien d’autre que le point de vue de l’ignorance . C’est pourquoi la « science profane », celle des modernes, peut à juste titre, ainsi que nous l’avons déjà dit ailleurs, être regardée comme un « savoir ignorant » : savoir d’ordre inférieur, qui se tient tout entier au niveau de la plus basse réalité, et savoir ignorant de tout ce qui le dépasse, ignorant de toute fin supérieure à lui-même, comme de tout principe qui pourrait lui assurer une place légitime,
Não há como resumir melhor o estado das ciências modernas, cada qual seguindo solitariamente o seu caminho em direção ao domínio cada vez mais completo dos detalhes e à ignorância cada vez mais completa do todo. Um progresso que consiste, em verdade, tal como assevera o próprio Guénon, numa regressão da inteligência. Este saber despegado do conjunto que se denomina realidade, isolado e inútil, sem que resulte da busca de uma compreensão ampla, sem que tenha implicações profundas na maneira como se encara o hoje, o ontem, a existência e suas razões de ser, realmente não se define melhor do que como um conhecimento ignorante.
Para além dos abalos incontornáveis…
Para além dos abalos incontornáveis na reputação de alguns dos autores analisados, a tese que permeia este Intellectuals, de Paul Johnson, parece justificar-se de maneira convincente pela variedade de exemplos oferecidos na obra. Demonstra Johnson que todo “intelectual” que se acredita capaz e deseja reformar o mundo segundo as próprias ideias acaba, cedo ou tarde, possuído por elas, o que significa adorá-las e tê-las acima da verdade, o que significa tomar partido delas em detrimento de pessoas reais. Possuído, converte-se em monstro moral, refutando pela conduta qualquer possível nobreza contida na ideia que o dominou. Em contrapartida, também demonstra Johnson que a saída para a atração magnética das ideias não pode se dar senão pelo apreço sincero à verdade e pela consciência de que uma ideia não vale uma vida. É uma obra que, como os bons tratados moralistas, humaniza por expor a desumanização.