Quando confrontamos um poema como este Noturno, de Fagundes Varela, com as bobagens que se consagraram no último século, ficamos com a sensação de que a poesia brasileira suicidou-se diante de aplausos da plateia. De um lado, temos uma alma que sangra e brada em versos, uma alma que se vale da arte em sua manifestação mais nobre, como transmissora da experiência mais íntima, mais intensa, mais sincera; já do outro lado… É mesmo um insulto o mero cotejar tais motivações, o mero supor que acaso sejam comparáveis. Não é pouca a coragem necessária para dar voz ao sentimento manifesto neste Noturno. Provando tê-la, Varela mostra não estar brincando de fazer poesia, e portanto não deve nunca, jamais ser comparado aos popularíssimos e aclamados brincalhões.
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O brasileiro, hoje, cresce desprovido…
O brasileiro, hoje, cresce desprovido de um ambiente cultural compartilhado. Cresce sem saber o que é, por exemplo, literatura. E se por acaso a descobre, se um milagre desperta-lhe a curiosidade por ela e então procura o lugar em que escrevem os grandes autores, em que os grandes críticos estão a apresentar e criticar obras literárias, a disseminar o que de melhor se escreveu e se tem escrito, ele não o encontra, porque esse lugar não existe. O que há de bom são páginas amarelas e desbotadas, compráveis de segunda mão. E é curiosíssimo notar que, hoje, mesmo o que se escreve sobre literatura, não se escreve, mas se fala: o formato da alguma crítica literária que subsiste, compelida pela audiência, é o vídeo. Livros e letras tornaram-se intragáveis. Esse fracasso cultural assombroso, causa de um fracasso humano ainda maior, não ocorreria jamais num país que dispusesse ao menos de uma elite culta, porque esta, se verdadeiramente culta, tomaria para si a obrigação de algo fazer pela cultura, de algo fazer pelo país. Mas não, não… o melhor, agora, é nem instigá-lo, porque o mecenas possível é um mecenas já existente e desgraçadamente deturpado.
O afastamento que não parece ter limites
O afastamento que não parece ter limites entre o português culto, já agonizante, e o português falado no Brasil, somado ao desinteresse cada vez maior pela escrita, evidenciado pelo aumento exponencial da oralidade, são motivos suficientes para demonstrar que, quem escreve hoje, escreve para potenciais leitores futuros. Por um lado, é isso um excelente incentivo à grande literatura, à literatura dos temas atemporais. Por outro, é o retrato de uma cultura morta, que inviabiliza, por exemplo, uma revista literária com autênticos literatos. Até a mídia escrita, se exclusivamente escrita, já parece inviável. Não é exagero dizer que, hoje, escrever é ou um ato de gratidão, ou um ato de fé.
Alguma experiência na literatura escancara…
Alguma experiência na literatura escancara a desagradável verdade de que os períodos mais produtivos, as inspirações mais fecundas se dão sempre e exatamente nos períodos de maior tensão interior. Faz-se a melhor arte quando a mente se encontra agitadíssima, muitas vezes à beira do colapso. Os temas surgem, as palavras aparecem e, sobretudo, não se suporta a imperiosa necessidade de escrever. Que coisa!