Gradis, portões e muros chapiscados…

Gradis, portões e muros chapiscados
— Circundam casas, prédios, lojas, tudo! —
Sobre os quais cintos eletrificados
Revestem cacos em perfil pontudo.

E os monstros desumanos, endiabrados
Às claras pela rua andam, contudo,
Os cidadãos assaz anestesiados
Aceitam normalmente o terror mudo.

Estupro, assassinato e latrocínio
São vezos na nação do morticínio,
Na terra onde existir é maldição…

Constantemente atribulado, alerta,
— Sabendo: vacilar é morte certa, —
O brasileiro habita uma prisão.

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Por que, maligna Vida, agir não deixas…

Por que, maligna Vida, agir não deixas
A desumana Morte já no início?
Por que germinas no homem esperanças
A convertê-las todas em suplício,
A convertê-las todas sempr’em queixas?
Por que camuflas-te em vãs seguranças?
Por que te tornas palco de vinganças?
Não compadeces vendo o sofrimento?
Ignoras o tormento
Que amarga-o a matéria enquanto vive,
Antes que a Morte prive
A boca de externar o sentimento?
Acaso agrada-te o pulsar da dor?
Sorris ao permitir que a Morte crive
O peito e a mente humana de terror?
Quem vê-te a essência mira-te em pavor!

Pois quem avista o Fado, mesmo tarde,
Encontra-o co’o malhete e a folha escura
À Morte despachando o fim secreto,
E em vão pragueja, em vão a si conjura
O espírito qu’em longo pânico arde
Ao ver-se condenado a ser objeto
Do mais atroz e horrífico decreto:
“Tudo o que fiz não teve utilidade!
— O desespero invade —
Sou alvo de uma besta predatória
Que arrasa até memória,
E nada brida-lhe a feroz maldade!
A dor que sinto nada significa,
Mesmo qu’imensa a angústia é irrisória!
Oh, maldição! Oh, terra infausta! Oh, zica!
Tenho de ser em chão que nada fica!”

Tortura intensa que jamais s’esgota,
Instala-se expulsando o sedativo,
Faz reino em que só o desespero impera,
Transforma o juízo em ferimento vivo.
Como sorrir se não há nem remota
Expectação matar de a cruenta fera
E a desintegração é certa à espera?
Como mirar sem choro o fiel amigo
Prevendo-lhe o castigo?
“Em desamparo irás deixar os teus,
Quiçá sem nem adeus,
E a obra tua irá sumir contigo…
Não há nada a fazer contr’esse mal,
É este o fado dos filhos de Deus:
Acometidos serem da mortal
E ingrata foice no dia fatal…”

Como, meu Deus, conter o forte pranto
Ante a ternura da face querida
Sabendo-a, como a si, sujeita à pena
Que tranca numa cela onde a saída
Exige a extinção total! E quanto
Não dói saber que o tetro Fado ordena
A mortificação e o ser condena
A perder totalmente o movimento!
Oh, Fado lazarento!
Qu’extingue a vida em sonhos incompletos,
Tratando como insetos
O ser que morre e o que rompe em lamento…
E pior sofrer com avançada idade
E a mente cravejada dos afetos
Exterminados, e ver a verdade:
Em vida quanto é bom vira saudade…

Mas também a saudade é condenada:
Se não míngua co’o tempo, vai embora
Acompanhada da matéria triste,
Acompanhada da mente que chora!
Oh, maldição rumar consciente ao Nada
E ver que o próprio choro não resiste:
Em vida morre tudo quanto existe!
E a mente desditosa enquanto acesa,
Denega em si a tristeza,
Revolta-se e o que aflige-a elimina,
Aviando na faxina
Aquilo que na vida tem beleza!
Quer a cabeça ser feliz e forte,
Mas é-lhe a infelicidade a sina…
Sofrer! Mas não pra sempre, pois, por sorte,
A dor acaba, visto existe a Morte…

Oh, desespero! A vida suportar
É empanturrar-se do insignificante,
Empanturrar-se até grande modorra,
Fazendo com que a mente não s’espante
E o raciocínio deixe de falar!
Pois do contrário é defrontar masmorra
Sem um único amigo que socorra
O pensamento do desassossego,
Gritando em pleno ofego,
Deliberando a solução terrível,
Mas ela é impossível!
Pois a coragem curva-se ao apego
E encobre-se tolhida da esperança,
Que nunca entrega nada de acessível
E vende o paraíso sem fiança!
Mas também ela um dia a Morte alcança…

Responde, Vida! Por que não te opões
Vendo-te a converter em dor intensa?
Por que a tortura? Por que suportá-la?
Por que mortificar o ser que pensa?
Qual a razão de tantas aflições?
Como deter o monstro que apunhala?
Por que apodreces morta numa vala?
Por que não cravas-te o que é nobre e terno
Na imensidão do eterno,
Mostrando haver no efêmero animal
Qualquer coisa imortal?
Por que não salva a mente deste inferno?
Há algo em ti que a Morte não liquida?
Por que não dás um mínimo sinal?
Há algo dure após a despedida?
Um sim seria tão mais belo, Vida…

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De súbito, o pensar ela penetra…

De súbito, o pensar ela penetra,
Abafa a voz interna em seu ruído,
E a confusão mental ela perpetra…
Sê forte pobre espírito oprimido!

Pois dá-se por concentração o esforço,
O cérebro a si mesmo apela, incita,
Mas ela faz talar qualquer reforço,
Invade e estoura em mente essa maldita!

Pois, camarada, escuta: é impossível!
Sempre qu’em algo fores concentrar-te
Verás ela irromper, cheia e audível!

Na Terra seja, em Júpiter ou Marte,
Onde estiveres, a infernal emana;
Ela atribula sempre: a voz humana!

(Este poema está disponível em Versos)

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Na vida cada sonho é uma miragem…

Na vida cada sonho é uma miragem
Irrealizável para além da mente;
Não se afligir é pôr-se, enfim, consciente
Que a cova é do futuro a suma imagem.

Maturidade em vida é ter coragem
A olhar nos olhos o vulgar presente;
Melhor o quieto, o triste, o que não mente
A si, e entende da vida a mensagem.

Aguarda-nos a todos uma tumba
Velada na necrópole do olvido,
Onde o silêncio é o eco que retumba

E a permanência eterna é obrigatória.
Nem mesmo o probo, o bom, sabe o vivido,
Terá na terra a mínima memória…

(Este poema está disponível em Versos)

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