Oito shots em dez segundos!

Acabo de assistir, por acaso, dez segundos de um filme lançado neste último ano. Conto impressionantes oito shots neste mísero intervalo, e imediatamente penso em Andrei Tarkovski. Segundo esse grande artista, a substância do cinema é o tempo e a função do cineasta é imprimir o tempo na tela. Segundo essa prudente visão da sétima arte, uma obra que sobrepõe alucinadamente oito shots em dez segundos é qualquer coisa, menos arte. Parece-me o cinema, assim como a música, de joelhos diante de um público incapaz da concentração. A obra — e talvez obra já nem seja a palavra adequada — precisa estimular, o tempo inteiro, a adrenalina, precisa entregar emoção instantânea e gerar expectativa para uma nova emoção no segundo seguinte, caso contrário, a atenção simplesmente dispersa, e o público passa a bocejar. Sem dúvidas, é esse um traço geracional, e parece cada vez mais difícil despegar-se desta terrível realidade moderna que se assemelha a este insuportável bombardeio de shots.

Atração e repulsa

Sinto, em mesma intensidade, atração e repulsa pela academia. Certamente, não é lugar para a minha espécie. Mas impressiona o número de mentes brilhantes que se acabam perdendo em troco de “integração”. Convenções, protocolos, hierarquias… tudo isso a minar, tolher criatividades, num ambiente onde o prêmio possível parece limitar-se ao reconhecimento. Fundamentar a obra de uma vida na esperança de aplausos? um cargo melhor, talvez? Parece frágil… No fim de tudo, esse caminho conduz a uma tremenda frustração.

O acordo com o poeta

Abro, graças a Pessoa, um volume de astrologia. O autor, já na introdução, adverte-me: “Se você não acredita nos princípios do que será exposto nesta obra, então ela não lhe terá utilidade alguma”. Fecho o volume, agradecido, e passo para o próximo. Que a astrologia funciona não resta a menor dúvida: basta abrir um aplicativo de namoro. Mas, em resumo, uma crença? Estudar para confirmar, sustentar uma crença? Por que não o contrário? Conquanto me empenhe, o acordo com o poeta parece não chegar. É em desalento que noto: o mosquito da crença não me picou.

É impossível ler em latim sem estar num estado absoluto de concentração

É interessante notar como é impossível ler em latim sem estar num estado absoluto de concentração, sem que a mente se volte inteiramente para a compreensão do texto. Os olhos, caso percorram linhas latinas dispersos, não fazem senão gastar o próprio tempo. E que dizer destes clássicos? Adicione-se à necessidade de esforço ininterrupto qualquer sorte de iluminação divina — isso, é claro, após alguns anos de estudo diário. Oh, língua…