O sucesso é a ruína do artista

Cioran resumiu: “Mourir inconnu, c’est peut-être cela la grâce”. Voltaire já havia concluído: “Vivre et mourir inconnu”. Valéry, na mesma linha, nota que “peut-être, si les grands hommes étaient aussi conscients qu’ils sont grands, il n’y aurait pas des grands hommes pour soi-même”. Que dizer? O sucesso é um sepultador. Talvez seja a maior desgraça que pode recair sobre um artista; é o prenúncio da ruína. O sucesso afasta-lhe as profícuas noites amargas, o questionamento terrível e maravilhoso sobre o próprio talento. O sucesso rouba-lhe a solidão e ilude, jogando areia no fogo interior que incita ao estudo, à evolução contínua, ao aprimoramento da técnica, à necessidade de uma expressão mais plena. Mas pior, muito pior. O sucesso abre “possibilidades” e impõe ao artista uma “nova função”. Isso, de fato, é-lhe a morte.

Uma cena inesquecível

Nunca me esquecerei desta cena! Um doutor respeitadíssimo, diante dos alunos, instruía-os quanto à organização da sala para a aplicação imediata de uma avaliação. Disse respeitadíssimo e reforço: o doutor era de uma imodéstia espetacular e gabava-se, a cada frase proferida, do prestígio que lograva a nível nacional em sua área de atuação. PhD, rico, fora o resto. Ele falava e eu aguardava a entrega de minha prova. Então ele puxou um pincel e escreveu no quadro como gostaria que a sala fosse organizada: à esquerda, do número tal a tal; à direita, deste àquele outro. E foi que eu vi, com meus próprios olhos, o exímio doutor grafar no quadro “de 1 a 15”, “de 15 a 30” substituindo os “a” por “há”. Eu vi. Não foi ninguém que me contou.

Só há humildade no silêncio

Só há humildade no silêncio, na abstenção, na recusa de potencialidades. Uma convicção externa, também, um julgamento da própria faculdade mental. Apenas busca convencer aquele que tem a si mesmo em grande estima. O ser humano confessa um crime, mas é incapaz de admitir, pelo silêncio, a fraqueza do intelecto. A loquacidade é, por isso, o sinal mais evidente da pouca sabedoria.

O sujeito lê o jornal e quer dizer ao mundo suas opiniões

Impressiona o interesse do indivíduo — e não sei se deveria dizer desgaste — por aquilo que lhe escapa totalmente ao campo de ação. O sujeito lê o jornal e quer dizer ao mundo suas opiniões. Discute com o vizinho, revolta-se na divergência, atrita com quem quer que lhe conteste. Então compra mais jornais, busca informar-se mais para, na próxima ocasião, aniquilar os adversários de um debate que jamais levará a lugar algum. Despende tempo e nervos no inútil. Lê, para cada página de jornal, uma a menos de Shakespeare. Não compreende a própria insignificância, ignora o caráter nocivo da própria postura. Mas prossegue, é claro, em nome de sua maior virtude: a vaidade.