O espantoso silêncio em redor de Otto Maria Carpeaux

Quando ladeados o monumento que constitui a obra de Otto Maria Carpeaux e o restante da crítica literária brasileira, é impossível não se espantar de não haver um único estudo biográfico digno do grandioso intelectual que entregou à crítica brasileira sua única obra de valor universal. Silêncio. Penso o que ocorreria caso Carpeaux, em vez de radicar-se no Brasil, optasse pelos Estados Unidos e fizesse, em inglês, o que fez em língua portuguesa. O sorriso é automático… Mas por que o Brasil? Por que, aos quarenta anos, romper com a própria língua e dedicar-se a aprender e escrever num idioma até então desconhecido? E o dificílimo, para não dizer impossível, foi erigido: a estéril crítica literária nacional ganhou um colosso imortal de presente. Que fez dele? Nada, absolutamente nada…

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O desalento de Drummond

Drummond disse, em sua última entrevista, nenhum de seus poemas ter entrado para a história do Brasil, ficando de sua obra apenas alguns “modismos” e “frases feitas”. Enganou-se, posto componha, hoje, o primeiro escalão dos poetas brasileiros de todos os tempos: é impossível uma lista dos melhores poetas ou uma antologia dos melhores poemas que não inclua o grande mineiro. Mas a afirmação, senão extrema modéstia ou percepção falha, escancara o desalento de alguém que, dedicando a vida às letras, não encontrou sequer sinais de recompensa até os seus últimos dias. Para não dizer da técnica, a obra de Drummond evidencia uma profunda compreensão da existência, problemas comuns à toda a humanidade, olhos abertos, atentos, que expressam o próprio espanto em imagens fortíssimas. Em suma: um poeta cuja obra se não resume em enquadrar clichês na técnica poética — qualidade raríssima… E, ainda assim, o insigne Drummond não enxergou retorno após décadas de trabalho, e mesmo após angariar grande reconhecimento a nível nacional. A pergunta: onde é que está o problema? Desta vez, meus dedos pouparão os olhos da querida leitora…

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Marcha, de Cecília Meireles

Um belo poema de Cecília Meireles:

As ordens da madrugada
romperam por sôbre os montes:
nosso caminho se alarga
sem campos verdes nem fontes.
Apenas o sol redondo
e alguma esmola de vento
quebram as formas do sono
com a idea do movimento.

Vamos a passo e de longe;
entre nós dois anda o mundo,
com alguns vivos pela tona,
com alguns mortos pelo fundo.
As aves trazem mentiras
de países sem sofrimento.
Por mais que alargue as pupilas,
mais minha dúvida aumento.

Também não pretendo nada
senão ir andando atôa,
como um número que se arma
e em seguida se esborôa,
— e caír no mesmo poço
de inércia e de esquecimento,
onde o fim do tempo soma
pedras, águas, pensamento.

Gosto da minha palavra
pelo sabor que lhe deste:
mesmo quando é linda, amarga
como qualquer fruto agreste.
Mesmo assim amarga, é tudo
que tenho, entre o sol e o vento:
meu vestido, minha música,
meu sonho e meu alimento.

Quando penso no teu rosto,
fecho os olhos de saüdade;
tenho visto muita coisa,
menos a felicidade.

Soltam-se os meus dedos tristes,
dos sonhos claros que invento.
Nem aquilo que imagino
já me dá contentamento.

Como tudo sempre acaba,
oxalá seja bem cedo!
A esperança que falava
tem lábios brancos de mêdo.
O horizonte corta a vida
isento de tudo, isento…
Não há lágrima nem grito:
apenas consentimento.

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Carência insuperável

Como ser livre se uma mínima desatenção expõe uma carência vivíssima que parece inerente à própria condição humana? Quer dizer: sem um monitoramento constante, uma atuação racional ininterrupta e o cérebro a barrar as manifestações vergonhosas de dependência e trilhar conscientemente o próprio caminho, o ser humano adota uma postura de insuficiência total. E terão de fantasiar para achar valor onde não há independência…

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