Há uma muralha entre o pensamento independente e o pensamento popular

Há uma muralha entre o pensamento independente e o pensamento popular que faz com que, quase sempre, haja repugnância entre eles. O interesse das massas é, por definição, contrário ao interesse individual. Isso quer dizer que endossar o discurso popular é ser contrário a si mesmo, é ver a própria singularidade diluída, é ser, em suma, um ninguém. E, naturalmente, o ninguém inveja o dissidente, o detentor da coragem que lhe falta, por isso “o prego que se destaca é martelado”. O covarde alegra-se da aprovação que angaria com a própria covardia, sente-se aceito e seguro. Por outro lado, carece de uma lápide para que não lhe esqueçam o nome… Não faz mal. Os amigos jamais lhe deixarão faltar a lápide.

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Matizes da vaidade

Que é vaidade? ou, antes: como ela se manifesta? A impressão imediata da vaidade em tempos modernos remete ao requinte em vestir-se, em portar-se. Seria isso condenável? Não creio. Os efeitos do esmero em vestir-se, assim como os de adornar a própria casa, ou cultivar um belo jardim, são positivos. O ser humano respeita o que é belo, inspira-se, quer ser belo igualmente: a beleza, pois, ramifica. Portanto, vejo a vaidade, neste matiz, como positiva. Entretanto, há nessa qualidade uma manifestação destrutiva associada à imodéstia, ao brio, à presunção. Há na psique do homem moderno um impulso terrível em prol da afirmação do próprio valor. Uma vontade velada, conquanto selvagem, que se manifesta no apego às próprias ideias, na necessidade de angariar respeito, concordância, e cuja substância resume-se em imaturidade. Alguém que se leva a sério falta-lhe a consciência. Como olhar sinceramente ao espelho e não rir?…

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A guerra contra a falsidade

O despertar de minha consciência deveu-se à percepção da falsidade no mundo. Despertando, o fantasma decidiu travar combate. Oh, guerra inútil, que tanto me atribulou!… Condenar a falsidade é ver-se rapidamente tomado do nojo para com as pessoas, é afastar-se, gradativamente, de todos, é tornar-se um misantropo. E, sempre em silêncio, transformei-me a mente em um grande tribunal. Repugnando-me a própria essência, avesso à simpatia, não poderia vivenciar fim diferente… Há uma dose de falsidade sem a qual o mundo não existe. As relações, se não estúpidas e superficiais, valem-se da dissimulação. E o interesse será sempre o principal motor das ações humanas. É aceitar, saber lidar, ou encontrar, em pouco, a existência insuportável.

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Riqueza e liberdade

Tornou-se moda diferenciar sinônimos a fim de adequá-los a ideologias e vender qualquer sorte de conselho. Os exemplos são inúmeros: “solidão” e “solitude”, “objetivo” e “meta” e muitos outros. Recentemente, deparei-me com um sujeito a diferenciar “rich” de “wealthy”. Segundo ele, rich people são pessoas com muito dinheiro, enquanto wealthy people são pessoas com muita liberdade. O raciocínio é o seguinte: a verdadeira riqueza (que pode ser traduzida tanto como richness quanto como wealth) está, em verdade, associada à liberdade, à disposição de recursos que permitam a desobrigação do trabalho, que abram possibilidades, que não exijam alto custo de manutenção, que produzam um fluxo de caixa altamente positivo. Naturalmente, em seguida o cidadão pretendeu ensinar como ser wealthy. Mas fiquemos com a ideia: riqueza e liberdade, dinheiro e desobrigação. O sujeito tem razão no que diz. Há uma falsa ideia, amplamente disseminada em todo o planeta, de que sucesso é majoritariamente atrelado a dinheiro, felicidade à riqueza, e valor a sucesso. Reconheço facilmente um escravo moderno: alguém constantemente preocupado, refém de inúmeras obrigações, sequioso da segurança e orgulhoso do que pode comprar. Digamos que seja milionário. É milionário, mas não larga o telefone, não pode faltar ao trabalho, não pode deixá-lo e compromete-se com variadas prestações. Tem uma casa enorme, troca de carro com frequência, consome em altíssimo padrão. Seria isso sucesso ou, antes, seria isso valor? O dinheiro só é nobre enquanto meio à liberdade, e envilece quando conduz à escravidão. Aceitando-se escravo, inconsciente da própria condição, o milionário não é senão um fantoche do dinheiro, submisso a um pedaço de papel. Entretanto, aceito-me a rendição: “valor”, hoje, assim como todas as demais palavras, parece escapar-me à compreensão…

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