O Poema triangular

Tive um sonho. Deu-se o seguinte: compus um poema intitulado “Poema triangular”. Basicamente, levei 5 minutos para reunir inúmeras palavras relacionadas a um triângulo, como “aresta”, “vértice”, “ângulo”, “catetos” etc. Em seguida, passei a organizá-las em versos, de maneira a realizar-lhes no comprimento uma progressão descendente, a conseguir que o poema aparentasse esteticamente um triângulo. Assim, compus 9 versos (9 é 3 vezes 3), repetindo as palavras e alterando ligeiramente as construções. Se não me falha a memória, o primeiro verso era “O ângulo da aresta do cateto do triângulo: ângulo”. Os outros eram semelhantes — diferentes — e o poema me não custou mais do que trinta minutos. Pois bem: publiquei-o e, imediatamente, fui aclamado o “maior gênio da poesia brasileira”, o “príncipe dos poetas”. Ouvi de todos e unanimemente que havia atingido a perfeição estética, que havia composto o maior poema da literatura universal. E, de repente, passei a palestrar, conceder conferências em todo o Brasil. Em um ano estava rico e, de poema traduzido em mais de 30 idiomas, recebi o Nobel. Acordei assustado, quando deliberei atirar-me pela janela…

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Ser pobre ou ser escravo?

Questão perversa e obrigatória a todos os que, nascidos em berço modesto, encontram-lhes os interesses inclinados a algo impopular. Pergunto: será possível uma inteligência interessar-se por algo popular? Talvez, conquanto incomum. Pois que a questão continua vibrante, imponente: ser pobre ou ser escravo? Não consigo interpretá-la senão como um confronto entre liberdade e desejo: respondê-la é decidir entre independência ou submissão. Entretanto, boas notícias: abrir as portas à pobreza não quer dizer, necessariamente, que ela se irá alojar.

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Desejo: câncer da psique humana

É possível encontrar justificativas racionais para negar as soluções propostas pelos estoicos, pelos budistas, por Schopenhauer e tantos outros. Mas há uma verdade universal, presente também na filosofia cristã, referente ao desejo: é ele a praga, o câncer da psique humana, a fonte interminável de frustrações. E se, após cuidadosa análise psicológica, decidimos arrancá-lo pela raiz, desarraigando cada uma de nossas esperanças a enxadadas, livramo-nos de uma carga imensa, maligna e prejudicial. O problema é que o ser humano vive de sonhos, suporta a realidade na esperança de um futuro melhor. Exterminá-la, pois, é fazer com que a vida perca o brilho, é dar linha à indiferença, é negar a própria natureza, é automutilação. Pois bem: parece ser esse o caminho da paz.

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O desejo de concordância

Poucos instintos são tão perniciosos às relações sociais e, especialmente, à personalidade do artista como o desejo de concordância. Em primeiro lugar, por ser esta uma manifestação da vaidade. Em segundo, pelas naturais implicações: discussões inúteis, antipatias gratuitas e fortalecimento do apego às próprias ideias. Tudo isso é veneno para alguém que deseja cultivar relações amigáveis e, pior, dar origem a uma obra artística. Conviver com o dissidente não é somente obrigatório, como o mundo é melhor por duas pessoas não pensarem igual. E quanto ao artista: que é que ele tem a ver com a opinião dos outros ou com a própria opinião? Desejar a concordância o tornará um egocêntrico, de antolhos, inclinado a usar da arte para adornar as próprias convicções. Como artista, inevitavelmente falhará, posto o desejo de concordância ser mancha que, em contato com a arte, impregna e não sai.

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